Narrativa de uma mente inquieta

Foi numa tarde de janeiro, que olhei para o lado e a vi sentada no chão, abraçando as pernas e cabeça apoiada aos joelhos. Fecho os olhos e ainda a vejo ali. Lembro de ter perguntado com tom sarcástico se ela estava daquele jeito por causa da política do país, da Síria, do Donald Trump e do resto do mundo. Achei que a faria me olhar torto como ela fazia sempre que perdia a paciência com meu jeito de ironizar os conflitos dela. Nenhuma de nós sabíamos como essas coisas todas estariam em junho. Mas ela não levantou seus olhos. Ficou lá. Estática.

Eu, como parte dela que sou, já estava perdendo a força para fazê-la levantar. Eu lhe sussurrava aos ouvidos palavras doces e por alguns minutos ela parecia corar, mas em seguida levava as mãos nas têmporas com força como se tentasse anular alguma lembrança. Teimosia!

Eu me lembro de tê-la visto chorando, com a mão no peito, achando que não ia aguentar. Eu olhava para ela do lado de lá e sentia que talvez alguma paixão a livraria da culpa de ter enlouquecido. Tem dias que você só quer que termine dentro de um abraço.

Foi arrastado esse nó, mas eu sei que ela está virando laço. As coisas pela terra pioraram, ela ainda perde o sono por ser tão miúda diante delas. As coisas. Mas à noite, antes de dormir, a sinto convidando a vida para dançar uma valsa na manhã seguinte. A gente bem sabe que sequer sabemos dançar, mas a coragem dela tem sido tanta que chego a ouvir a música, até daqui de dentro do espelho.

*Textos de Quinta - Para fugir da responsabilidade.

Um a cada quinta. Não é promessa, é desejo =)

Marília de Dirceu
Enviado por Marília de Dirceu em 08/06/2017
Reeditado em 08/06/2017
Código do texto: T6021699
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