Eh, Marvada!
juniverso.blogspot.com
"Co'a marvada pinga é que eu me atrapaio
Eu entro na venda e já dô meus taio
Pego no copo e dali num saio
Ali mesmo eu bebo, ali mesmo eu caio
Só pra carregá é queu dô trabaio, oi lá!"
(Ochelsis Laureano e Raul Torres)
Longe de querer fazer tipo, inicio dizendo que não tenho muita intimidade com tal personagem, embora algumas garrafas estejam sempre à mão, no armário da minha cozinha, entre livros de receita, pimentas, ervas para chá e temperos do dia-a-dia.
E é um lugar de honra, já que considero este um dos ambientes em que mais gosto de estar. Direi ainda que dos poucos amigos que nos visitam, quase todos confessam sua paixão, principalmente pelas mineiras, fabricadas em pequenos engenhos, de tiragem reduzida. Imagino que deve ter lá o seu charme saber que poucos provarão “aquele” néctar. Quando é presente então, o valor é inestimável. Com certeza alguns saem convictos de que participaram de algum ritual ancestral, tamanha a cerimônia.
Confesso porém que apesar da pouca familiaridade, me incluo no seu rol de admiradoras e reconheço que é mesmo uma celebridade. É internacional, tem fã-clube e prestígio. E nem faz tanto tempo era a marginalizada bebida de preto e pobre! Hoje frequenta salões palacianos, tem exclusivos clubes de apreciadores, enfim, é cult admitir que se beba cachaça. Alguns ratificam: cachaça, pinga não! Ciosos de sua reputação de conhecedor da bebida.
Gosto das conversas, dos causos, das histórias em torno e sobre ela. São, quase sempre, divertidas e muito reveladoras. Se bobear, o efeito é maior que o soro da verdade...
Confesso que até gosto dela quando disfarçada de licor, de batida de côco geladíssima e de caipirinha absurdamente açucarada. Heresias dirão, mas fazer o quê? Pura só se for para desinfetar um corte, pois também não há como negar seu vasto uso farmacológico, imortalizado na voz do querido João Nogueira, na deliciosa “Boteco do Arlindo”.
Engraçado como todos têm uma receitinha: espirrou, uma com limão; dói a barriga, uma misturada; levou pancada, uma com barba-timão; e se dói o dente, se faz frio, se faz calor, pra criar coragem e por aí vai um sem fim do “serve para” em que a apreciada obra do acaso revela sua serventia.
Por fim, como se já fosse pouco o que representa, destaco aqui seu uso educativo, a despeito do que se publica na literatura médica. O causo é que certo doutor se empenhava em assustar seus pacientes apreciadores de aguardente, consumida por muitos naquela pequena cidade. Falava-lhes dos males , das sequelas, dos dissabores mas reconhecia o pouco efeito que seus discursos causavam.
Até que resolveu ser mais enfático fazendo uma demonstração no consultório: diante do paciente atento, pegou um ovo, quebrou-o em um copo e adicionou uma generosa dose da mardita ao mesmo.
- Veja como o senhor fica por dentro quando bebe cachaça...
O ovo começou a escurecer. Mais um tempinho e tudo estava completamente preto.
- Viu aí? Está convencido do que lhe falei?
- Sim, dotô. Depois dessa nunca mais como ovo!
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"Co'a marvada pinga é que eu me atrapaio
Eu entro na venda e já dô meus taio
Pego no copo e dali num saio
Ali mesmo eu bebo, ali mesmo eu caio
Só pra carregá é queu dô trabaio, oi lá!"
(Ochelsis Laureano e Raul Torres)
Longe de querer fazer tipo, inicio dizendo que não tenho muita intimidade com tal personagem, embora algumas garrafas estejam sempre à mão, no armário da minha cozinha, entre livros de receita, pimentas, ervas para chá e temperos do dia-a-dia.
E é um lugar de honra, já que considero este um dos ambientes em que mais gosto de estar. Direi ainda que dos poucos amigos que nos visitam, quase todos confessam sua paixão, principalmente pelas mineiras, fabricadas em pequenos engenhos, de tiragem reduzida. Imagino que deve ter lá o seu charme saber que poucos provarão “aquele” néctar. Quando é presente então, o valor é inestimável. Com certeza alguns saem convictos de que participaram de algum ritual ancestral, tamanha a cerimônia.
Confesso porém que apesar da pouca familiaridade, me incluo no seu rol de admiradoras e reconheço que é mesmo uma celebridade. É internacional, tem fã-clube e prestígio. E nem faz tanto tempo era a marginalizada bebida de preto e pobre! Hoje frequenta salões palacianos, tem exclusivos clubes de apreciadores, enfim, é cult admitir que se beba cachaça. Alguns ratificam: cachaça, pinga não! Ciosos de sua reputação de conhecedor da bebida.
Gosto das conversas, dos causos, das histórias em torno e sobre ela. São, quase sempre, divertidas e muito reveladoras. Se bobear, o efeito é maior que o soro da verdade...
Confesso que até gosto dela quando disfarçada de licor, de batida de côco geladíssima e de caipirinha absurdamente açucarada. Heresias dirão, mas fazer o quê? Pura só se for para desinfetar um corte, pois também não há como negar seu vasto uso farmacológico, imortalizado na voz do querido João Nogueira, na deliciosa “Boteco do Arlindo”.
Engraçado como todos têm uma receitinha: espirrou, uma com limão; dói a barriga, uma misturada; levou pancada, uma com barba-timão; e se dói o dente, se faz frio, se faz calor, pra criar coragem e por aí vai um sem fim do “serve para” em que a apreciada obra do acaso revela sua serventia.
Por fim, como se já fosse pouco o que representa, destaco aqui seu uso educativo, a despeito do que se publica na literatura médica. O causo é que certo doutor se empenhava em assustar seus pacientes apreciadores de aguardente, consumida por muitos naquela pequena cidade. Falava-lhes dos males , das sequelas, dos dissabores mas reconhecia o pouco efeito que seus discursos causavam.
Até que resolveu ser mais enfático fazendo uma demonstração no consultório: diante do paciente atento, pegou um ovo, quebrou-o em um copo e adicionou uma generosa dose da mardita ao mesmo.
- Veja como o senhor fica por dentro quando bebe cachaça...
O ovo começou a escurecer. Mais um tempinho e tudo estava completamente preto.
- Viu aí? Está convencido do que lhe falei?
- Sim, dotô. Depois dessa nunca mais como ovo!