CONFORMISMO
Dia desses, no ônibus enquanto ia para o centro da cidade, ouvi a conversa de uma dupla, dessas que fazem questão de serem ouvidas por todos e buscam simpatizantes para suas ideias.
Falavam que tempo bom era o tempo em que os ptralhas estavam no poder.
Dizia uma delas, com o total apoio da outra, que naquele tempo se podia comprar qualquer coisa pelo crediário, que o custo de vida não era tão alto como está agora no governo de Temer, que as pessoas pobres recebiam o bolsa família, todo posto de saúde tinha os remédios, todo mundo podia receber uma casa do programa minha casa minha vida, existia financiamento até para estudar no estrangeiro. Não tinha esse negócio de protesto pelas cidades nem se ouvia falar tanto em corrupção...
Claro que não participei da conversa, mas não pude deixar de ouvir nem de considerar o quanto é prejudicial a falta de esclarecimento para que a pessoa possa analisar a situação que estamos vivendo, com base nos acontecimentos que nos levaram ao atual status quo, sem partidarismos e sem antecipar condenação ou absolvição dos gestores envolvidos, pois afinal isso é atribuição do poder judiciário.
Talvez pelo interesse que eu tenho sobre o imaginário não pude deixar de fazer um paralelo com uma das lendas bíblicas sobre o conformismo com as situações por mais danosas que sejam e da necessidade de um guia, um mentor, ou guru que a maioria da população sente e que é narrada no livro Êxodo, sobre a aversão às mudanças, quando o povo de Israel saído do Egito, portanto da escravidão para vida livre, se lamenta por perder tudo aquilo que supostamente recebia de graça e que sem a figura do “salvador” precisa assumir as responsabilidades para continuar usufruindo o bem estar.
Grande parte da população não entende que os ganhos sociais do primeiro mandato de luladrão só ocorreram porque houve acertos nas diretrizes econômicas desde Itamar Franco que foram mantidas por FHC, mas que luladrão, por despreparo para exercer o cargo, por se aliar às ideologias populistas e de maximização do Estado, a pseudos terroristas ladrões e principalmente por tentar a manutenção do projeto de poder pelo poder, desviou recursos mais do que necessários ao nosso desenvolvimento.
O canteiro de obras prometido e decantado em discursos histéricos não passou de meras obras caindo aos pedaços ou inacabadas, grande parte delas inúteis e todas superfaturadas por adendos a perder de vista.
Nossa infraestrutura de transporte é, talvez, o mais vil dos retratos dessa realidade.
Aquele discurso histérico de que com os ptralhas no governo não haveria chance para moeda especulativa, que somente o capital instalado geraria riqueza aos seus donos, transformou-se na estratosférica taxa SELIC;
nos maiores lucros líquidos do setor bancário, notadamente os bancos Itaú, Bradesco, Santander que são particulares;
em isenções para grandes empresas multinacionais;
empréstimo subsidiado para empresários "amigos";
para empreiteiras dos “amigos” e a fundo perdido para ditadores internacionais;
em reajustes antecipados de preços e tarifas cujo prazo fora fixado por acordo internacional, referendado pelos congressos dos países envolvidos (casos da compra ao Paraguai do excedente de energia gerada em Itaipu e do gás natural boliviano);
na aceitação pura e simples da apropriação de ativos da Petrobrás feita pelo exército boliviano por ordem de Evo Morales presidente daquele país, além de perdões de dívidas não pagas por ditadores africanos sob a desculpa, esfarrapada, de que temos uma dívida social para com os ex-escravos.
Além disso, ainda cometeu o desatino de fazer a sua sucessora, uma ex-guerrilheira autoritária, intratável, incompetente e mal educada, numa eleição com todos os ingredientes para ser considerada fraudulenta, a qual, por dar continuidade aos roubos e às interferências presidenciais, através de seus comparsas nos postos chave da Petrobrás, transformou a segunda empresa mundial do setor de petróleo na empresa mais endividada do mundo.
Programa social bom não se mede pelo número de pessoas que entram, mas pelo dos que saem com capacidade de se manter sem as esmolas oficiais.
Cotas para ingresso nas universidades não significa melhoria na qualidade do ensino que, diga-se de passagem, é vergonhoso.
Apesar do orçamento para a educação ter sido triplicado no período, temos um contingente de analfabetos funcionais que também desconhecem o que são e para que servem as quatro operações fundamentais de matemática, razão pela qual podemos afirmar que a gestão desses recursos também foi feita por incompetentes.
Mesmo sabendo tratar-se de recurso figurativo necessário à lenda bíblica, espero que nós brasileiros não tenhamos que passar os 40 anos que os israelenses foram obrigados a vagar no deserto, para nos libertarmos dos efeitos maléficos da corrupção e que tenhamos brevemente a maturidade necessária para atingirmos a "terra prometida" da plena cidadania.