Beleza Salvadora
A beleza é a salvação da alma. Sem o belo, as forças desagregadoras impõem a falta de harmonia em nosso espírito de tal forma que a vida cai em um ritmo desarmônico horrível. A beleza, como força construtora, edifica e aglutina, repara e unifica.
Sem o belo, transitamos na mais profunda secura ordinária, vítimas indefesas da feiura diária. E, todos hão de convir, o horror viraliza-se como uma praga exponencial, contaminando desde as relações deformadas com nosso próximo, passando pela tenebrosa violência cotidiana, até chegar, monstruosamente dramático, no noticiário político. Aqui, o belo dá lugar à feiura ostensiva, disforme e acompanhada de uma moral desvirtuada.
O brasileiro, hoje, é refém perene de uma anormalidade generalizada nas altas esferas administrativas do país, donde a delicadeza da honestidade e o bem supremo da gerência social sumiram completamente do horizonte de consciência, e, não bastando o desmazelo disseminado e crônico, camadas e camadas da mais pútrida mentira são oferecidas como único recurso justificável, como forma evidentemente espúria de legitimar condutas grotescas e, no fim das contas, toscamente improvisadas pelo horror à verdade, ao bom e ao belo.
Restam-nos, ainda, a beleza suprema e sem contaminação do nosso solo, do nosso clima, de nossas praias, florestas e paisagens (quando não o horror também toma as feições da destruição da natureza e nem isso é possível mais). No entanto, talvez esteja aí o último refúgio de beleza possível nos recantos tupiniquins. Imagino, por exemplo, um bom sertanejo que, cansado da televisão que lhe rouba descaradamente sua energia para a contemplação do belo, pausa o telejornal e vai espraiar seu olhar para a janela de sua humilde casa, no meio da roça. Ali, ainda é possível refrescar-se com um horizonte límpido e de expectativas verdejantes, e onde o galinheiro, a pocilga, a plantação de mandioca e a montanha ao fundo compõem uma harmoniosa e agradável disposição de beleza bucólica. O bom sertanejo sorri, aliviado, reconfortado sem saber muito bem porquê e, sabiamente, desliga a TV e pede pra sua mulher preparar um café forte, pois sua alma está novamente e provisoriamente salva pela beleza, em comunhão humilde com o essencial libertador.