VIDA & OBRA DE LEONARDO MOTA

VIDA & OBRA DE LEONARDO MOTA

Um simples e belo desenho estilizado de "Lampião" num cordel recente no FACEBOOK me despertou amemória adormecida para a obra de "LEOTA" -- que li na juventude, nos anos 70 -- o "cineasta"do sertão, registrando em imagens vivas fatos e "causos" que vivenciou ou dos quais ouviu falar. O advogado LEONARDO MOTA largou tudo, fechou seu escritório na capital (Fortaleza,salvo engano) e se embrenhou nos sertões desse sofrido Nordeste, vivendo creio eu da caridade dos que encontrava em suas andanças. Isso foi por volta de 1910 !

Como não podia andar com secretária a tiracolo, aprendeu com ela a escrita dos sinais, taquigrafia que,adiante, feita por engenhosa maquininha,se chamaria estenografia. Com seu inseparável caderninho, rodou por todo o agreste de 3 ou 4 Estados,anotando os desafios e registrando "na lata" repentistas e cantadores. Empresas como a NATURA, o Banco ITAÚ e a PETROBRÁS poderiam dar novo RUMO aos seus editais, recuperando essa CULTURA VIVA (e do povo) que são os cantadores,os repentistas e a literatura de cordel.

Enquanto isso não acontece, quem sabe o cinema nacional não toma coragem e abraça essa causa, a VIDA e a obra de Leonardo Mota merecem tal homenagem. "LEOTA" deixou indelével na memória dos que o leram belas imagens desse eterno "triste sertão", por vezes "sertão alegre", mas sempre brasileríssimo. Seus livros "VIOLEIROS DO NORTE" e "CANTADORES" (e repentistas) eternizaram poetas do canto e da rima,registraram para a posteridade gênios de alpercata e gibão da Poesia cantada e/ou declamada, além de raros embates que ultrapassaram as fronteiras do lirismo, caindo na vala comum do preconceito raso, da luta de classes, da contenda infinda entre ricos X pobres, da intolerância social contra o desfavorecido, o feio, o indigente, os com alguma deficiência física.

Memorável o desafio,em diversos vilarejos, do repentista branco -- ou se supondo assim -- com o negro pobre, ainda escravo,cantando em troca de moedas para sobreviver. Só esse registro,redivivo nas telas dos cinemas ou nas páginas de um novo livro, justificaria a existência quase inútil de um MinC voltado apenas para as classes A e B e sempre de costas para o povo !

"CANTADORES" (& repentistas) vale seu peso em ouro, registra magníficos duelos do início do século passado, embate s candentes merecedores dos aplausos dos ouvintes interessados e curiosos daquela época. O escravo INÁCIO DA CATINGUEIRA se notabilizou pela beleza dos repentes,seu dono o liberava de noite para os desafios em vilarejos próximos... teve um adversário cruel, que vergastava sua côr e o cabelo, a ignorância das letras esua pobreza franciscana. "LEOTA" narra que o negro jamais se abalou... recebia com respeito e altivez os insultos em forma de versos e respondia com elegância. Com sua melhor "fatiota" (terno, para quem não sabe) o escravo-cantador entrou para a História do cordel, pelas mãos ágeis do ex-advogado. Aliás, todo estudante deveria saber taquigrafia, pela extrema simplicidade da mesma e por ser muito útil.

Fecho esta singela crônica com a inesquecível resposta do sobrinho ainda vivo dos célebres Irmãos NOGUEIRA, ases do repente naqueles tempos, ofendidos por um iniciante pretensioso que se dizia melhor do que os citados. Assim que soube do fato, o ferreiro sentou-se para produzir as 4 estrofes mais ferinas do Cordel: "Quem quiser falar de mim / cante e grite pela rua... /eu como é na minha casa, / cada qual coma na sua"! Para conhecer a obra original "in totum" só consultando o livro.

"NATO" AZEVEDO (escritor, poeta e compositor) - 24-25/maio 2017

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OBS: o cordel "Triste Sertão Alegre" é complemento desta crônica, por isso sugiro conhece-lo !