Copenhague Zero Grau - No lado de baixo do tal de Equador
Série Copenhague Zero Grau
Há, no lado de baixo do tal de Equador, cinta geográfica na barriga da Terra, uma terra bonita e cheia de sol, onde as cebolas apodrecem nas janelas das vendas e as enchentes botam lama no meu quarto de dormir. Lá, costumava-se bater naqueles do contra, naqueles que dissessem não, mas dizem que tudo já passou, que já não há baionetas nas ruas, pelo menos é o que dizem os jornais. Lá, na terra dos meus pecados, estão a me esperar de braços abertos, com as gavetas cheias de problemas e as facas de cozinha afiadinhas, tudo pronto para o seu deles uso, logo ao apagar das boas-vindas.
Lá, na terra dos meus pecados, pai, mãe, irmãos e não sei que quanto de parentada ensaiando a banda, ele volta, meu Deus, como demora o nosso amilho, quer dizer, amigo e filho, cadê as bandeirinhas, quem é que está picando confete, cadê os cartazes, a banda já está a postos?
Aqui, a primavera abriu os braços esta manhã, três dias atrasada, e eu abri as janelas de par em par, quando cheguei ao emprego, mas meu coração se encolheu, e eu vi que estava só.
Aqui, quero abrir as asas, mas o coração fica pequenino e com medo deste país que não para, não perdoa e não deixa de funcionar, país de super-homens e mulheres, quer queiram ou não os que não nasceram aqui, que aqui viveram entre os eleitos, mas que têm as raízes lá embaixo, do lado de baixo do tal de Equador.
Tem gente aqui que diz que volta logo, nem que seja num avião de uma asa só. Vou pensar no caso.
(Copenhague, Dinamarca, 26/03/1979)