Liberdade
Todos os dias (bem cedo) beijava a mulher e os filhos e saía para o trabalho. Um lutador anônimo cheio de sonhos, ilusões e até planos. No caminho de ida, o bom dia. Na volta, o boa noite. Às vezes sorria, às vezes chorava, mas na maioria do tempo a carranca era o estado normal. Quem sabe, o peso da responsabilidade ou o amargo da vida!? O certo é que estava na luta. O certo é que estava presente, construindo uma história.
No ônibus, o mesmo aceno silencioso, a mesma postura facial, o mesmo lugar à janela e os mesmos trajeto e destino. Na empresa, o mesmo horário, os mesmos amigos, as mesmas máquinas, as mesmas tarefas, o mesmo ritmo, o mesmo espaço, os mesmos ideais e o mesmo salário, no mesmo dia, mesma semana por meses, anos e sempre, em todos os momentos, o mesmo medo do desemprego.
Tudo estava milimetricamente organizado para a não mudança. Um esquadrinhamento perfeito para a subsistência apenas. A luz acesa ao fim do túnel tinha a distância do arco-íris. A liberdade física tinha a extensão do planeta Terra para um andarilho do tempo e da vida. O espaço livre para passeios não era mais que esse. Mas o suficiente para acreditar na liberdade. Uma liberdade que nasce dentro de cada ser humano.
Todos os dias (bem cedo) beijava a mulher e os filhos e saía para uma viagem sem volta. Aquela que é marcada pelo relógio e que, quando perdida, não perdoa. Todos os dias um aceno ao (muito particular – eu) era o início da peregrinação ao mundo obscuro do dentro e do fora do homem. Não há outra maneira de ser livre, senão apenas entregar-se aos afazeres do cotidiano e caçar a liberdade – onde ela estiver –, para um vôo que não se prende aos limites da atmosfera terrestre.
Carlos Alberto Fiore. Publicado entre os anos de 1994/95, no Jornal “O Cidadão” – Limeira SP.