A relação de pais e filhos
“Filhos, filhos, melhor não tê-los.
Mas, se não tê-los, como sabê-los”?
(Vinicius de Moraes)
Procuro acompanhar meus filhos em sua caminhada terrena, conversando sempre que posso, ensinando-os, ajudando-os em suas tarefas. Algumas vezes ríspido, mas sempre com amor, pois como está na Bíblia, “os filhos são herança do Senhor”. São tesouros que me foram presenteados por Deus. Já disse antes que meu pai quando me colocava no colo me fazia dengo com voz de criança: “pesenta, pesenta, pesenta ganda uma” (um grande presente).
Meus filhos são os maiores presentes que eu ganhei. Foi assim com os dois mais velhos, uma com 36 e outro com 34. E de igual forma com os dois menores, com 11 e 8. Uma mistura de prazer e responsabilidade, satisfação e dever. Então tenho que cuidar bem deles.
Nem todos os pais pensam assim. E esta afirmativa se dá pela observação que faço no curso da minha vida e porque há quem discorde frontalmente de mim, criticando, até mesmo censurando esse meu modo de criação. Respaldo meu posicionamento na Bíblia: “Educa a criança no caminho em que deve andar; e até quando envelhecer não se desviará dele” (Prov. 22:6).
Posso parecer demasiadamente cuidadoso com a minha presença, sempre que posso com meus filhos, mas entendo que isso é meu dever, minha obrigação, uma de minhas missões terrenas, pois, eles não pediram para nascer. Fui eu, com suas mães, quem quis que viessem, pois, do contrário, teríamos evitado a gestação.
Há pessoas que optam em não ter filhos. É uma opção para que satisfaçam com maior intensidade e volúpia aquilo que elegem como aproveitar a vida. Para que se ocupem única e exclusivamente com ações voltadas inteiramente para si, para seu máximo deleite.
E assim, podem realizar mais passeios, encontros com amigos, frequentar bons restaurantes, cinemas, teatros, vinícolas, assistir shows de bandas, de orquestras, de cantores, de comediantes, óperas, exposições de arte, desfiles de modas, palestras, cruzeiros, excursões, viagens para conhecer outras cidades do país e de outros países, com seus museus, edificações, templos, torres, suas praias, cânions, escalar montanhas, praticar esqui na neve e nas águas, esportes radicais, maratonas nacionais e internacionais, passeios em balões, montanhas russas, alpinismo e muitas outras atividades prazerosas que a presença dos filhos com seus afazeres escolares, atendimentos médicos e odontológicos e outros, moléstias passageiras e outras demoradas, acaba frustrando, tolhendo, impedindo que isso aconteça em sua plenitude.
Mas, como entendo e ressalto, filho não pediu para vir, não pediu para nascer, cabendo então a eu fazer tudo que estiver ao meu alcance, dosando com minhas necessidades e afazeres da vida uma atenção e assistência mais efetiva. E para mim (provavelmente pela minha descendência indígena) essa ocupação, essa dedicação, é altamente compensadora, satisfazendo meu íntimo.
O sorriso de um filho que acabou de aprender a equilibrar-se e andar de bicicleta é infinitamente compensador (me desculpe quem pensa ao contrário), emocionante, extasiante. Há quem diga que esse tipo de criação torna-os dependentes, tolhe suas iniciativas, não aguça a qualidade de tomar decisões. Discordo frontalmente. E sustento esse posicionamento, porque com os dois mais velhos fui assim e eles logo no início de seu amadurecimento, tão logo obtiveram a formação universitária, alcançaram a autonomia, a forma e o meio de se sustentarem e buscarem seus objetivos.
E minha filha, não raro lembra e exalta a influência que exerci.
Ensinei-os andar de bicicleta, a nadar, a representar nas peças infantis, a se portar em público, às vezes sendo exigente e insistente para vê-los desempenhar com excelência suas tarefas. De outra forma não poderia deixar de ser com os atuais.
Existe uma corrente de pais que, às vezes para justificar a ausência ou uma falta de maior dedicação, que de tal forma subtrairia o tempo para si, sustentam a tese de que os filhos, mesmo crianças, precisam se virar cedo. Dar seu jeito, como se diz coloquialmente. Mas às vezes isso é o reflexo do que foram seus pais, como foram tratados, deixados ao vento, sujeitos a intromissão e influência, na maioria das vezes maligna, traumatizante, desastrosa, péssima.
Costumo dizer que se o pai ou a mãe não ocupa o seu lugar na vida dos filhos, esse lugar, essa lacuna, pode ser preenchida por um estranho. E essa ocupação estranha nem sempre é boa. Pelo contrário cria traumas nem sempre suplantados.
Procuro então ser participativo, principalmente com os atuais, menores, pois não sei quanto tempo me resta, haja vista que, pela ordem natural, ficarei menos tempo com eles do que com os mais velhos.
05/04/2016
.............................................................
Ontem, domingo, à tarde vendo um trecho de um programa de TV, no qual uma jovem atriz que participava de um programa envolvendo famílias, dela e de outra atriz, fez uma declaração que muito se identificou comigo, com a forma como vi meus pais e como vejo que devo ser com meus filhos, dois já com mais de trinta anos e dois ainda crianças.
A declaração da jovem atriz levou-me às lágrimas, tanto por se identificar comigo como por encontrar pessoa fora do âmbito de meu relacionamento pessoal, seja familiar ou de amizade, que pensa como eu. Mais porque ela fez a declaração emocionada e publicamente.
Disse a jovem atriz que o seu sucesso, que ela estava ali, porque sua mãe abrira mão, ou seja, abdicara de vários de seus sonhos em prol dela, a filha.
Emocionei-me porque minha mãe também agiu assim. Trabalhava como professora estadual de ensino fundamental e costurava para fora, como diziam à época, ou seja, fazia roupa para outras pessoas, às vezes varando a madrugada, domingos e feriados. E tudo que ela obtinha, com a ajuda de meu pai, era para a nós, os filhos, ficando ela em segundo plano.
Poderia ela ter feito como outras mães de seu tempo, usado o dinheiro que ganhava para viajar a passeio, se vestir melhor, comprar joias e fruir melhor o fruto de seu labor. Mas não! O que ela ganhava era para nós, eu e minhas irmãs, suas crias, além de ajudar seu pai e um irmão em dificuldades, seus sobrinhos e muitas pessoas que a procuravam pedindo ajuda. Foi assim minha mãe que partiu aos 88 anos.
Sua forma de trabalhar levava-a a estar quase sempre em casa convivendo com a gente. Nós é que saíamos para estudar, visitar colegas, ir ao cinema e ao retornarmos lá estava ela trabalhando em casa.
Não me lembro de ter perguntado a ela se pudesse voltar no tempo seria diferente, pensaria mais em si. Mas, pelo que a conheci, teria dito que faria igual ou mais além. Sua alegria maior era nos ver alegres, nos sobressaindo em nossa vida profissional e familiar.
Hoje vejo muitas mães e pais que ganham de razoável para melhor não abrindo mão de seus sonhos. Pagam boas escolas para os filhos, compram-lhe bons presentes, mas dispensam pouco tempo aos filhos, pensando mais em si. É uma opção cujo preço é pago anos e anos depois, quando pagam.
11/07/2016