As Patas do Cavalo e a Morte do Cavaleiro
Fiquei sabendo que esses cavaleiros de bronze que ficam nos parques, ás vezes nas praças e até dentro de Colégios tem um significado de acordo com a pata do Cavalo. E todo o significado é relativo à sua desgraça final. Quando o cavalo tem as duas patas dianteiras levantadas, o sujeito morreu na batalha, quando é apenas uma pata dianteira ele morreu de ferimentos ocorridos na batalha. Agora quando as quatro patas estão grudadas no chão o estrupício se desencarnou de morte natural. Quem me contou essas coisas foi um tal de Zé Sólon, cara avermelhado de barba grande e espinhas na testa. Já havia visto ele algumas vezes na Praça da Cruz vendendo salgado e suco no saco, mas nunca havia puxado papo, o bicho fala cuspindo e tem um hálito de gente que dormiu bêbado sem escovar o dente. Eu perguntei ao meu pai sobre essas coisas e ele me olhou de lado com a cabeça meio caída, e respondeu que morou na roça toda sua infância e grande parte da vida adulta, mas nunca ouvira dizer tal coisa. “Isso é coisa de gente sem o que fazer!” concluiu meu pai, voltando os óculos ao olho para enxergar os buracos que fazia em um pedaço de couro, tive curiosidade de saber o que era aquilo que parecia um bornal, mas minha conta de especulações havia se esgotado. “Será que aquele cara chapiscada, estava com alguma zombaria comigo!?” Gritava meus pensamentos que se emaranhavam, voltando ao ponto de partida. “Se era verdade aquilo, o que teria a ver uma pata do cavalo levantada com ferimentos de morte do cavaleiro. Não teria que ser o próprio montador a levantar a sua perna?” Perguntas e mais perguntas, mas nenhuma resposta a vista. — Você está sentindo bem rapaz? Indagou o trocador do ônibus em tom de galhofa. — Sim estou por quê?- respondi com audácia lhe devolvendo a interrogação. — Do jeito que vem falando sozinho, achei que houvesse fugido de algum hospício! – Junto aos desaforos do albino, vesgo de dois dentes enormes saindo fora da boca, alguns passageiros fizeram côro e soltavam risos sem trela. Assim, resolvi envolvê-los no meu insensato enigma. — Você! Apontei para um magrelo de chapéu branco e camisa xadrez. — O que é que tem eu? – Devolveu o sujeito. — Me diga se já viu em alguma praça ou parque, destas esculturas de homem sobre o cavalo! – Disse emudecendo o trocador albino e a trupe que o seguia no meu escárnio. — Sim, claro para isso tenho olhos! – Respondeu grosseiramente o homem. — Então diga, quando o cavalo está com as duas patas levantadas, qual é o significado? – Ponderei me levantando para olhá-lo nos olhos. — Eu é que sei, entendo mal e mal de cortar grama de jardim, vou lá saber de porra de cavalo levantando perna! O significado deve ser falta de tomar uma piratada no chifre, se está levantando a perna deve ser querendo derrubar o dono que está montado! Ou então pode ser que o infeliz esteja estranhando o montador que por sinal não é o seu dono. – Olhei com nítidos sinais de desdém e balancei a cabeça negativamente. Em volta todos aqueles que zombavam guiados pelo trocador, fingiam se virarem para não serem argüidos. Mas o trocador com seus dentões enormes feito um parente caricato do Pernalonga não escaparia. Eu só esperaria o ônibus seguir seu trajeto, já que estava parado em um ponto, o barulho da catraca girando contrastava com os movimentos da cabeça dele, inquieta e preocupada com a minha presença. Mas o ultimo passageiro a subir na plataforma, foi justamente aquele causador de toda a confusão. O cara de chapisco com sua barba sem fazer, Zé Solon, que projetava seu hálito mal tratado a quilômetros. Preferi deixar o trocador de lado e descer, assim não ouviria novamente que a forma como o cavalo se portava, era indicação de como o cavaleiro morrera.