Troca de camisas

O fundamento da isenção é a imparcialidade. Quem não é isento não pode ser imparcial e em geral só reconhece um dos lados, excluindo o outro. Quem estiver do lado não preterido, será bem visto, bem-quisto, será amigo. Do outro lado estarão os indesejáveis ou inimigos.

A visão parcial normalmente conduz à intransigência, à intolerância, à objeção pré-concebida. Pelo prévio estabelecimento de que apenas um dos lados estará com a razão. O que não acontecerá em hipótese alguma com o outro. Não importa o que de mais correto possa existir do outro lado. Um belo exemplo disso são os regimes ditatoriais. Mas não podemos nos esquecer de que as ditaduras não se verificam apenas pelo viés militar. Há a ditadura da moda, a da palavra, a do pensamento, a da articulação do pensamento. E uns cem números delas destinadas à imposição.

A parcialidade estabelece o confronto, o desentendimento. No fundo, cada um dos lados usa das mesmas armas, das mesmas reações, de visões com grandes chances de acabarem distorcidas. Por partirem do princípio de que o outro lado não tem a mínima condição de ser entendido.

Nesse sentido, reconhecer qualidades ou atributos de quem possa tê-los, independente de quem por algum motivo não gostemos ou não sejamos afins, devia ser sagrado, uma obrigação. Afinal, a afinidade pode ser pessoal, mas ela não deve dispor sobre o valor, num sentido amplo, de cada um. Sob pena de permanecermos no singular. Andando atrás do próprio rabo.

Um comunista não deve ser detratado apenas por ser comunista. Mas o capitalista também não. Os atos de ambos dirão quem são. Na França, agora, se a propaganda corresponder à verdade, o mandatário diz-se de centro. Não quer saber da esquerda nem da direita, ambas eivadas dos mesmos sectarismos. Pode ser uma solução ou, ao menos, uma alternativa.

Sabemos disso e talvez por essa mesma razão detestamos um jogador quando ele é do Flamengo, até porque já detestamos a torcida. Mas o aplaudimos bastante, se for o caso, quando, com novo contrato, ele joga pelo nosso time.

Rio, 15/05/2017