Não tenho mãe. Uma crônica do professor Carlos Jaime

Amigos, não tenho mãe para postar mensagens a ela, mas à que tive quero dizer:

Obrigado, pelas lapadas de cipó de marmeleiro na beira do rio Aracati, elas doeram pra caramba, mas me ensinaram que mentir faz o homem mentiroso e desacreditado socialmente.

Obrigado pelas chineladas na bunda por fazer birra de raiva por algo que eu não podia ter. Elas me ensinaram que a gente não pode ter tudo o que a gente quer.

Obrigado pelos coques na cabeça eles me ensinaram que não devemos infernizar a vida das pessoas que amamos, pois isso, além de machucar, nos transforma em seres insuportáveis.

Obrigado por me obrigar a beijar um irmão como castigo por termos brigado. Isso me ensinou que devemos viver em união e em respeito socialmente e um irmão é um membro da comunidade em que estamos inseridos.

Obrigado por ter -me obrigado a tirar a corda do armador da rede para com ela a senhora me bater. Isso me ensinou que o castigo físico é necessário e nós mesmos temos de cooperar com o próprio castigo para sermos moldados.

Obrigado por algumas vezes ter ocultado do papai um mal feito meu com o propósito de não me ver apanhando dele, pois a um filho a gente castiga mas não gosta que outros o façam mesmo sendo o companheiro da gente, mas que apesar de me proteger me dizia baixinho como correção: isso que você fez não se faz. Esta sua atitude me ensinou que apesar da justiça merecida, na vida temos quem se compareça de nós.

Obrigado, mamãe, pelas vezes que disse de mim para outros: ele é muito inteligente. Se pudesse ajudaria a estudar.

Obrigado por algumas vezes ter me elogiado sem que meus irmãos percebessem para não ficaram com ciúmes. A senhora uma vez me disse algo no ouvido que ainda hoje guardo em segredo para que meus irmãos não saibam. Afinal, segredo é segredo, embora a senhora não tenha pedido segredo eu entendi que não era pros outros saber. Isso me ensinou que nem tudo nosso devemos contar mesmo aos mais íntimos.

Obrigado por ter muitas vezes deixado de jantar para que a parte que lhe tocava fosse dividida com os 7 filhos que a pesar de dormir com a barriga triste teria o doce prazer de ver os filhos satisfeitos.

Obrigado, mamãe, porque hoje 32 anos depois vejo em Deus alguns traços que via na senhora. Mesmo não conhecendo muito sobre Deus a senhora sabia imitá-lo e muito bem.

Obrigado porque o que sou hoje foi determinado naqueles poucos anos que vivemos juntos.

Carlos Jaime

CARLOS JAIME
Enviado por CARLOS JAIME em 13/05/2017
Código do texto: T5998094
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