A Estátua
A mocinha estava desatenta, passando pela “Praça da Catedral”, quando deu de cara com um sujeito de estatura média, encapuzado e portando o que parecia ser uma pistola 9 milímetros.
— Isso é um assalto! Passa a bolsa! — Diz.
A pobre menina nada fala, apenas entrega, com pavor impresso em seus olhos, a bolsa com dinheiro, cartões de credito e todos os documentos. E o marginal, que também estava alarmado, trata de escafeder-se logo dali.
No centro do local, cercado pelas águas da vistosa fonte, está a estátua do Governador Dix-Sept Rosado, que nada pode fazer além de observar a cena cotidiana.
A mocinha chora. O governador já presenciara cenas comoventes, mas nenhuma como aquela.
— Se eu pudesse ajudá-la… — Pensa.
Mas não podia. Teria que ficar ali, com sua postura robusta e seus trajes elegantes por toda eternidade, até que o tempo o destruísse.
A jovem esforça-se para enxugar as lagrimas e seguir seu caminho.
Atravessa a rua e some em meio à multidão de carros, tornando-se poeira ou brisa, nunca se sabe.
E o governador continua ali, assustado, mas com pose de quem acaba de subir num palanque e está prestes a discursar para uma multidão. Jamais o faria, já que era nada mais que um enorme pedaço de bronze, sob um notável pedestal de granito róseo, esculpido por um italiano cujo nome ninguém sabia.
— Não podiam, pelo menos, ter me construído em outro lugar? — indaga.
Queria estar nos mausoléus da Índia, nos mosteiros da China ou nos memoriais dos Estados Unidos. Contentar-se-ia até mesmo se o tivessem construído de costas para orla de Copacabana, como a estátua de Drummond.
Mas, para sua eterna infelicidade, algum idiota teve a ideia de fazê-lo justamente ali: no centro da cidade onde nascera, na velha Praça Vigário Antônio Joaquim. Onde não havia mar, água de coco e, tampouco, garotas de biquíni.
Estava cansado de ouvir sempre o mesmo barulho: era o sino da Catedral de Santa Luzia, que, de vez em quando, soava pelos ares.
E as pessoas continuavam sua eterna correria, mas ninguém o notava desde ontem pela manhã, quando um turista do Maranhão vislumbrou-se com sua beleza.
— Olhe, Luíza! Aqui diz que ele foi um importante governador do Rio Grande do Norte!
— Bonito, né?
— Vamos tirar um selfie!
Aquela era só mais uma das fotografias tiradas ali, mas o famoso governador não deixava de se orgulhar cada vez que alguma alma humana reparava em sua figura ilustre.
— Olhe aí! Será que, algum dia, hão de construir um monumento em minha homenagem? — Pergunta alguém ao reparar escultura.
A única certeza que tenho é que se Dix-Sept Rosado soubesse que, após sua morte, mandariam construir um monumento em sua homenagem, ele jamais deixaria.
A mísera estatua está, literalmente, agonizando em praça pública, junto aos pedintes e bebuns da cidade centenária.
Quer falar e não pode, quer andar e não consegue, quer até mesmo chorar e não é capaz. Quer, além de tudo, alimentar-se, mesmo que dos pequenos grãos de milho jogados aos pássaros, estes que, vez ou outra, defecam em sua cabeça.
Pobre governador! Parado, mudo e sujo.