UM VASO DE BARRO SUJO
 
Faltando bem mais de um ano para que eu completasse os meus setenta aniversários, mas é nesse período que consigo, não só me lembrar, mas também tenho mais aspirações para que as minhas escribas comecem melhor a se exteriorizar.
Eu estava determinado a edificar uma fonte enfrente a nossa cabana de veraneio. Após colocar as pedras empilhadas de uma forma que parecia que elas estavam brigando umas com as outras, mas foi de um formato proposital, tentando agradar a mim mesmo: bem ara assim que eu queria. Em cima daquele amontoado de pedras, eu coloquei uma escultura representando um rosto que entalhei na pedra, para que pela boca fosse jorrada a água: Bem agora fiquei pensando no recipiente onde a água iria ser jorrada, e pensei, e pensei, e continuava pensando quando uma vizinha chamada Verinha estava passando exatamente naquele momento, e eu por brincadeira lhe perguntei: Verinha o que eu devo colocar para receber a água desta escultura? Ela olhou para a minha fonte e depois para mim respondeu sem pensar muito: coloque um vaso de barro que vai ficar lindo com esta tua fonte. – obrigada Verinha é o que eu vou fazer.
Fiquei com a minha obra inacabada pensando em compô-la com um vaso de barro, que iria comprá-lo no meu regresso para São Leopoldo. Fui a uma floricultura e não encontrei algo que me chamasse à atenção e que tivesse as medidas adequadas.
Voltei para casa meio que frustrado. Mas eu queria mesmo era colocar um vaso de barro, pois eu já o estava vendo na minha imaginação, o vaso de barro, recebendo a água da minha fonte e combinando com a minha arte.
Mas quando eu voltei para casa, a minha cunhada me ligou: Neri eu estou com um vaso de barro aqui em casa, sobrando das arrumações que fiz no meu jardim, e quero doá-lo: Bah é justamente o que eu preciso, segura este vaso aí que eu estou a caminho.
Era justamente o que eu buscava. Voltei para casa com aquele presente e não via o momento de colocá-lo na minha fonte, o que aconteceu no próximo fim de semana. Ficou lindo e a fonte jogando a água dentro do vaso, com sincronia e beleza rústica e eu todo exibido com a minha obra, que também serviria para os apreciadores que passassem em frente a nossa cabana.
O tempo foi passando, e o vaso ficou sujo com nuances pelas suas bordas externas. Então um dia eu o lavei e ele ficou super limpo, parecia novo. Mas ninguém notou a sua limpeza. Mas ele com o tempo voltou a sujar.
Eu um dia estava de uma maneira relaxada no meu deck, tomando um suco, e olhando aquele vaso sujo, e comecei a pensar a respeito. Se sujar eu posso limpá-lo, mas depois ele suja de novo, então fiquei olhando e procurando entender o porquê daquelas nuances feitas pela água, respingando, pelo vento soprando vegetações, areia e até sapos e outros bichos que por curiosidade, também tinham participado daquelas nuances que ficava mais pulcro do que um vaso limpo, e que nós não conseguiríamos reproduzi-las pelas nossas mãos. E pensei comigo mesmo é melhor o vaso sujo ou limpo? Acho melhor sujo. Pois o meu vaso é para ficar externo, então ele deve ser sujo para conviver com o que a natureza tem para compartilhar com ele.
Quando a gente procura ver e admirar as coisas da natureza, e saber por que elas acontecem, a gente acaba vendo que tem coisas mais bonitas quando enfeitadas pela força da natureza, do que quando a limpamos. Olha como está lindo o meu vaso de barro sujo.
Scaramouche
Enviado por Scaramouche em 07/05/2017
Reeditado em 20/11/2020
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