CONTANDO CASOS AOS 70 ANOS
 
Quando eu tinha aproximadamente 17 anos, resolvi fazer um curso de datilografia. Na década de 1960, eu achava isso uma das coisas mais importantes, e por um tempo eu ostentei o meu diploma de datilógrafo feito no curso Duque de Caxias em Porto Alegre, devidamente pendurado na minha sala. Já pensou o que era fazer parte de algum escritório batendo máquina? Parecia até um pouco mágico para a idade que eu tinha.
Naquela época longínqua eu gostava de escrever – e gostava mesmo. Mas a vida tomou outros rumos, e eu os segui – pois a vida é de seguir rumos e caminhos.
Segui os caminhos que foram se abrindo e fui descobrindo os horizontes à minha frente e deixando o passado, lá, no passado. Mas eu continuava querendo escrever, assim também queria fazer outras coisas, e ia fazendo, alcançando mais maturidade. Mas a vontade de escrever voltou - uma vontade latente que ficou escondida até eu conhecer melhor o mundo e adquirir mais sabedoria e poder escrever algo mais importante, ou sem importância, mas algo maior, que valesse a pena estar escrito... teria que fazer algo importante que pudesse ser escrito...preferi escrever.
com meu estudo incompleto fui gerente do setor administrativo de uma empresa multinacional, com o ginásio, durante seis anos, até pedir demissão, pois eu tinha o salário que queria, mas não a função que queria.
Não sou escritor, e não escrevo de forma literária, nem cuidando de todas as regras ortográficas. Mas é um português que todos entenderão sem precisar consultar dicionários, pois eu sou um contador de histórias da vida como ela é. A história é contada por alguém que está dentro dela, das suas situações, sem métodos, mas sempre usando o senso de observações de quem viveu acima dos 70 anos empregando as experiências adquiridas, com realismo e sensibilidade, para falar das verdades observadas, e às vezes mal observadas ou mal interpretadas, indo talvez para o lado do engano ou da ficção, mas para mim é tudo verdade.
Para escrever, eu devo também ler, pois este é um dos melhores recursos para quem gosta de ficar apertando as teclas como eu. Como eu ficaria sabendo que tem pessoas que escrevem sem curso literário, mas que gostavam de escrever e por isso fizeram as suas escritas percorrerem o mundo.
É o caso da Ana Lins do Guimarães Peixoto Bretas. Quem será? Pois ela é a Cora Coralina que faleceu em 1985 aos 95 anos de idade, e que estudou até o primário - era considerada uma grande escritora. Depois tivemos a Carolina Maria de Jesus, talvez, vocês jovens ainda não conhecem a sua história – ela, apenas alfabetizada, nasceu em 1914 em Minas Gerais e foi morar posteriormente em São Paulo. Era juntadora de lixo, recolhia livros, revistas e jornais da rua e depois os lia – da sua maneira, com a sua interpretação e transmitia a sua ideia, um lado humano de ver as coisas
A Carolina, durante os anos de 1955 até 1960, fez um diário da vida que levava como juntadora de lixo para sustentar os seus três filhos. Através do jornalista Audálio Dantas, que descobriu o seu diário, transcreveu a sua história “quarto de despejo” em livro que vendeu mais de um milhão de exemplares e foi traduzido para 13 idiomas. 
Por isso eu estou escrevendo aos 70 anos, e atualmente aos 77, pois aprendi muito, observei muito, e pensei muito sobre a vida, com ideias que não deram certas, e outras muitas, que deram, pelas experiências vividas. Por isso só agora! Mas o que vou escrever ficará pelo mundo, por algum tempo, e poderá servir para alguém, e se não servir... Mas agora já escrevi.
Scaramouche
Enviado por Scaramouche em 04/05/2017
Reeditado em 26/11/2020
Código do texto: T5989270
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