O teco-teco vermelho

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a minha ampla e arejada varanda vejo um teco-teco vermelho sobrevoando o mar da Pituba. Presa à sua cauda ele arrasta uma faixa colorida anunciando um produto. Minha acentuada miopia não me deixa identificá-lo com a precisão desejada por um consumidor exigente.
     O tempo está ótimo. Não há uma nuvem sequer no céu de Salvador. O mar, em dia de calmaria, lança, suavemente, suas ondas sobre as areias doiradas da praia ensolarada.
    Nesse céu de brigadeiro e mar de almirante, o teco-teco vermelho desliza, cumprindo, com competência, sua missão de garoto propaganda.
     Em tempos de luxuosos Boeings e Airbus, não me constrange dizer que os teco-tecos continuam  a me encantar.  Eles foram os primeiros aviões que eu conheci.
     No Iguatu, sertão do Ceará, cidade da minha infância, era uma festa quando os teco-tecos, vindos de Fortaleza, chegavam de surpresa, fazendo alegres acrobacias. Voavam tão baixinho que se podia  dar um adeusinho ao piloto, sempre de farda caqui e óculos ray ban
     A cidade não tinha um aeroporto. Tinha o que o povo chamava de um "campo de aviação". Sua pista era de barro, cercada por centenas de cajueiros frondosos e acolhedores. Por entre eles, os teco-tecos pousavam e decolavam. 
     Para o campo de aviação a meninada acorria, querendo ver de perto o avião subir e descer,  segundo eles, "imitando os sabiás, as graúna, e  os urubus".
     Os pilotos do Aeroclube de Fortaleza,  vez em quando, convidavam o povo do Iguatu para ligeiros passeios aéreos.  Pelo voo, nada era cobrado.
    Filas enormes formavam-se ao lado da pista.
     Todos queriam ver, "lá de cima", em arriscados voos rasantes, o leito do Jaguaribe, o maior rio seco do Nordeste, a maior atração local, e o casario de telhas vãs.
     Fiz - acho que em 1945 -,  num teco-teco azul-marinho, o meu primeiro voo. O bicho jogou muito.  Após  pousar, procurei, correndo, o mictório: por pouco não fizera xixi nas calças, tamanho foi o medo que senti, principalmente na hora da decolagem.
     Este teco-teco, que agora avisto da minha varanda arejada e ampla sobrevoando o mar da Pituba, me traz u´a saudade danada do meu primeiro passeio aéreo.
     Muitos voos eu já fiz.  Mas em nenhum fui tão feliz como naquele do teco-teco azul-marinho, eu mal havia completado onze anos de idade. E já vivi mais de meio século!
         

 

    

Felipe Jucá
Enviado por Felipe Jucá em 08/08/2007
Reeditado em 28/05/2014
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