A.C.G.B.F.F. (BELCHIOR)
In Memorian
 
 
            O mar sempre me fascinou e continua a me fascinar! Seus mistérios, suas imprevisibilidades, uma imensidão de água. Sonhos, sons e medo. O homem vive pelo mar e do mar a vida brota em ondas desde o início dos tempos, marinando pensamentos, invocando contos e cantos nesta vivência. Foi assim que Antônio Carlos Gomes BELCHIOR Fontenele Fernandes singrou com sua vela partindo de “Mucuripe” para as profundezas da Música Popular Brasileira. Percorreu mares, aportou em portos, navegou pelas ondas sonoras do rádio, se firmou como um inteligente e promissor compositor. Com ele, continuo a navegar até hoje pelo mapa  mundi do coração!
            Suas letras enveredavam pelo abissal pensamento filosófico e inquietante de um ser em constante busca e transformação interior! Arraigado de forma esplendorosa, sua voz peculiar marcava pelo seu timbre vidas, gerações, modo de ver e estar no mundo e em particular em nosso glorioso Brasil pátria amada. Um marco nacionalista se fazia presente, um sul-americano autêntico e orgulhoso de sua origem, aliás, isto é um ponto em sua existência. A “Alucinação” que toma conta do dia-a-dia da vida das pessoas se fazia presente em sua obra musical, em sua ótica de como ver a existência humana. Este homem, este latino americano, encantou muitas almas, acompanhou minha adolescência, minha existência e experiências de um jovem sonhador, embalado por letras e sons tangentes. Uma canção em especial, tocava e tocava-me de forma mágica, “Como nossos pais”, atingia-me aos 14 anos de idade, impactante... Um ícone sem nenhuma dúvida! À época me parecia meio controversa, hoje, tenho a certeza, mas, a escuto no presente com maturidade, o que me proporciona uma releitura maravilhosa de minha vida com o mesmo brilho no olhar.
            O romantismo pontua de forma generosa em um “Coração selvagem”, desbravando sentimentos, uma ebulição de formas diversas de falar do maior sentido da vida, o amor! Esta canção continua marcando pessoas, não tem idade, ela é atemporal, apaixonante, afinal, o amor é o início, meio e fim daquilo que dá sentido à existência humana. Belchior foi iluminado por um anjo musical, sonoro e letrista que o acompanhou desde sempre, conduzindo-o a ser um enxadrista de este sentir eterno em notas justapostas. Quem não tem boas lembranças dos cinemas, dos amasso, das marcas de batom, das paixões, das emoções do bem querer, do respeito que havia no comportamento, todavia, diferentes nos dias de hoje! Pode até soar como um saudosismo, que seja assim então, tudo era tão maravilhoso, tão difícil, daí porque tudo  é tão banal nos dias de hoje...
            Dante Alighieri e sua “Divina Comédia” se fez morada profunda dentro de Belchior. A condição filosófica da existência e sua influência na essência cantada pelo amor maior por ele é uma “Divina comédia humana”, entrelaçando o tempo, o espaço, as estrelas reluzentes no céu da boca da musa amada, o fazendo um cancioneiro incansável, um amante a se eternizar em “Todos os sentidos”! Medo? Só se for de avião! Mas se a mão certa está ao alcance, tudo fica uma maravilha, a alma fica mais leve, a dúvida se desfaz, e o medo pega o beco, nunca mais!
            Belchior, já está fazendo falta, lacuna jamais preenchida! Então como “Começar tudo outra vez”? Talvez você esteja voltando pra casa, apenas um rapaz latino americano, sem dinheiro no banco... Mas, quanta saudade vai deixar! Não há dinheiro que pague nem remuneração que cubra sua ida. Certamente você não sairá do caminho de muita gente, ficará na memória não como uma foto 3x4 mas, como um pôster gigante, um out door de Led, iluminado por uma saudade intensa, enquanto havia “Galos, noites e quintais” nos lembrando de uma “Velha roupa colorida” nesse “Pequeno mapa do tempo” em que esteve entre nós vivendo, que passamos sem perceber, entre “Paralelas” como um “Sujeito de sorte”, sem medo da morte ou de “Cemitério”, porque a vida é eterna, “Onde Jazz Meu Coração”?
 
Que te seja leve
Tua passagem
Antônio...
            
 
Ricardo Mascarenhas
Enviado por Ricardo Mascarenhas em 01/05/2017
Reeditado em 17/07/2020
Código do texto: T5986614
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