GREVE DO "TRABALHADOR"?
Algumas, poucas e superficiais reflexões do meu agora filósofo de bar já quase contumaz. Fui a dar-lhe ouvidos e ele entendeu que estava a lhe oferecer cadeira e mesa. Mas o rapaz era simpático e ao me ver, pouco tempo depois saiu da mesa em que estava com outros e veio à minha. Adiantei a quem estava comigo que ouviríamos preleções filosóficas de um psicólogo de bar. Rimos e o rapaz aproximou-se, cumprimentado-nos e solicitando um dedo de atenção, se permitíssemos. Pelo menos não era enxerido, apesar de notadamente e intencionalmente chato para alguns que tivessem opinião formada e, principalmente, inflexível.
Servi-lhe cerveja e ofereci o tira gosto mineiro, carne de sol com mandioca. Na mesa, um amigo de esquerda, que nos últimos tempos sentava calado e saia sem falar... Por ser amigo eu lhe dedicava atenção e agora já estava confiando em sua recuperação. Mas vamos ao relato dos fatos ou "falas da prosa".
O moço, como disse em texto anterior, era um estudante de psicologia que usava o bar para os seus "experimentos", ou seja, para demonstrar suas "teses", colher reações, possíveis sugestões e conselhos, a embasar seu trabalho final de graduação.
Dois goles de cerveja, comentários sobre o tempo chuvoso, e a observação de que ele ouvia a rádio de manhã onde um repórter entrevistava populares na Praça Sete: você está acompanhando a Reforma Trabalhista? Sim, respondeu um com orgulho. O que você acha? Acho que querem acabar com a nossa aposentadoria, foi a resposta. O segundo ao responder que estava também acompanhando, posto que nessa hora todos querem se fazer "por dentro", o jornalista perguntou o que ele achava que estava certo e o que estava errado na reforma. A resposta foi que estava tudo errado e que estavam querendo tirar o direito dos trabalhadores, e isso justificava a greve do dia vinte e oito com a paralisação do país. Outro, mais sincero, falou que sua mãe estava acompanhando, e outro estava com pressa para chegar ao trabalho mas em princípio era contra. O último, quinto ou sexto, mostrou conhecimento profundo sobre o tema: "Fora Temer!". Daí o nosso garoto-psicólogo concluiu: são essas pessoas que vão à greve? - olhou nos olhos de todos, principalmente nos de meu amigo petista, ex ou quase ex. Dei de ombros, como a dizer que não me interessava, ou que a observação era fraca. O meu amigo segurou a fala, pediu mais uma cerveja.
O futuro psicólogo parece que pressentiu o incômodo de meu amigo e lascou: o PT assumiu o poder com a promessa de ilibada conduta, realizar todas as reformas necessárias, como as fiscal, trabalhista, previdenciária, política, agrária... Em treze anos realizou só duas: a do triplex do Guarujá e a do Sítio de Atibaia... (De soslaio vi que meu amigo ficou impassível, imaginei que estava mordendo os lábios).
Agora, me digam, quais os direitos dos trabalhadores que estão sendo lesados? O FGTS, as férias, o décimo terceiro, a carteira assinada? Qual o direito? - Arrisquei: o direito de ser escravo de uma legislação de 1943. Isso mesmo, foi a resposta!: uma casa de 1943 se não for reformada ou restaurada vai virar entulho...
De acordo que não houve perda, vamos ao ganhos: trabalho descontínuo limitado a 8 horas por dia, 44 semanais e 220 por mês, ou seja, você que tinha o trabalho engessado agora vai pode flexibilizar negociando sua jornada de acordo com suas necessidades. Trabalho em casa? Sim, pode levar trabalho para casa e ser remunerado por tarefa. Não é legal isso? Descanso de 30 minutos; já pensou em chegar à faculdade depois do trabalho 30 minutos antes, ou chegar em casa antes das crianças estarem na cama? Também não é bacana? As férias, aquelas que iniciavam na véspera de feriadão ou na sexta-feira não será mais permitida. Quem ganha? Trabalho temporário de 90 para 180 dias não vai gerar mais emprego? No Natal o comércio sempre contrata os "temporários". Não será agora a oportunidade de talvez um contingente desses temporários ficarem mais tempo e serem também talvez efetivados? Talvez sim? Não é melhor que talvez não? A contribuição sindical passa a não ser obrigatória, palmas! Isso não merece palmas? O trabalhador quer continuar sustentando verdadeiros feudos sindicais com o seu suor? Você sabe quantos sindicatos temos no Brasil? Mais de dezesseis mil? E nos Estados Unidos? cento e trinta! Sabia? Esta vergonha, cabide de emprego, saúva do sistema, parasita dos trabalhadores, não tem que ser reduzida ao mínimo legal e necessário? Me contem, até aqui onde o trabalhador está sendo prejudicado? E tem mais: a multa do empregador que não assinar a carteira do funcionário passou a ser de meio salário para três mil reais. Isso não é favorável ao trabalhador?
Calma, meu jovem! Nada contra o seu entusiamo, você está certo em tudo o que falou. Mas, muita calma nessa hora. São mais de 100 itens que foram mudados, devem ser analisados com calma e ponderação. Alias, deveriam ser analisados antes da votação. Mas não é tarde ainda. Tenho que o governo é legítimo ainda, uma vez que o capitão que estava conduzindo o barco direto para o iceberg que iria causar a catástrofe foi substituído, graças ao motim dos marujos que pressentiram o naufrágio, pelo sub capitão, oficial de mesma formação e na linha hierárquica sucessória. Se ao assumir não desviasse a rota, seria o que? Um burro, que estaria a manter a rota de seu antecessor, né? Portanto, teve que dar uma guinada. Salvamo-nos a todos então? Nada, salvamo-nos do iminente. Mas não do comprometimento com o ditames de um tal de
Foro de São Paulo. Ou seja, com os preceitos de uma esquerda socialista metida a ser a única possuidora da chave do Reino Perfeito, a que chamam de URSAL ou Grande Pátria... Se o capitão (ou capitoa) não emplacou as reformas prometidas, pelo menos o seu vice não esqueceu das promessas. Além de legítimo substituto o foi como cavalheiro de boa memória, como diria Cervantes... (lembrei de meu copo com a cerveja quente).
Você tá por dentro, hein veio! Bateu no me ombro o rapaz. Ri, meu amigo ao lado também riu. Com o canto dos lábios, senti que estava dando sinais de volta à vida. Ou teria sido um meio sorriso irônico, de ex militante e ex pseudo-metido-a-intelectual...?. Intelectualóide e comunista de gibi... Isso que é meu amigo, imagine se não fosse! Coitado, torço pela sua recuperação.
Não me interrompam, quero só completar: por exemplo, a terceirização. Sempre existiu, as montadoras são um grande exemplo. As multinacionais, principalmente as ligadas ao setor de petróleo, há mais de 30 anos colocaram seus funcionários a trabalhar como PJ. Agora vem uma lei materializar isso, e dizendo que só pode contratar o funcionário como PJ após cento e oitenta dias da demissão. Balela! Como firma individual, modernamente a tal de EIRELI, pode até que ter que respeitar este prazo. Mas se um funcionário se juntar a outro e fundar uma LTDA, poderá já prestar serviço à empresa-mãe no dia seguinte. E não está errado, dou a maior força. Sempre digo, e não sei se meu amigo petista concorda, que feliz será o dia em que todos os trabalhadores sejam empresários de si mesmo, estando ou não na livre iniciativa. Cada um tem que vender bem e honestamente o seu peixe.
Falou?
Deixa eu observar, disse o jovem: neste mês de abril, a metade do mês é de feriado e finais de semana. Tem-se 14 dias de trabalho e o empregador tem que pagar 30 dias para seus funcionários. Clareou a ideia aí, meus senhores? Estes empresários são mais do que trabalhadores, não merecem serem chamados de heróis?
Calma, meu jovem! Tem empresários e empresários...
Calma, meu veio! Coloquemos a ética acima da lei e os empresários como postulantes a uma retidão na postura.
Meu jovem, navegar é preciso, sair da maionese é mais preciso... (rimos todos).
E eu, com o meu mineirês, perguntei: Meu jovem, ainda que mal pergunte, qual o título de seu TFG? Resposta: Possibilidades Metafísicas do Ser Humano pelo Desenvolvimento da Consciência!
Armand de Saint Igarapery - Postagens no Face e no Recanto das Letras