“DONA MORTE, CHATO ISTO”
Esta noite para mim foi algo inusitado, diferente mesmo de tudo que este caipira tinha visto. Passo geralmente às noites acordado, mas como eu estava a duas noites sem dormir, ou se dormi foi apenas por alguns minutos, acho que minha mente precisou de um descanso.
Eu como sempre faço tomei banho, escovei as canjicas, estendi o edredom porque estes dias esta frio em Belo Horizonte e me deitei pelado, coisa de peão de trecho que se agarra aos vícios do passado de aventuras quando para facilitar e despertar a libido já dormia sempre assim.
E não é que eu dormi? Um sono gostoso e um sonho melhor ainda, eu sonhei com uma mulher linda me agarrando e me beijando e de repente olhei para ela estava peladinha que nem eu, era um quadro perfeito, acho que estou muito tempo fora das aventuras, porque eu senti meu coração disparando dentro do peito com tal violência que explodiu.
No impulso da explosão eu me sentei na cama e neste momento eu vi. Na minha frente tinha uma mulher linda vestida com uma saia curta e uma blusa decotada mostrando parte dos seios e exalando um perfume suave, os olhos castanhos brilhavam e ela sorria com uma boca vermelha mostrando dentes brancos certinhos e alinhados. Fiquei com cara de bobo com tanta beleza.
Depois de um minuto de boca aberta, consegui balbuciar: - passei mal e estou no hospital e você é a doutora? - Não meu caro poeta caipira dos olhos azuis, eu não sou a doutora, eu sou a morte respondeu-me. – Que isto, me disseram que a morte é um esqueleto ambulante de vestido preto sem dente e quase careca que anda com uma foice na cacunda e agora vem uma modelo linda dizendo que é a morte.
Está brincando comigo não é? Estou não meu trovador, você acha que vou me apresentar mal vestida para um cliente? Afinal sou a morte, mas já fui mulher – Gente, como é que pode, está bem, dona morte, quer dizer que eu morri? Não morreu ainda, mas eu vim para lhe dizer que seu tempo acabou e vim te buscar.
Olhei aquele monumento de mulher à minha frente e destrambelhei, a essência do meu espírito caipira se manifestou eu soltei a verborragia: - uai e que qui nóis ta isperano? Levantei o edredom e mostrei toda a pujança daquele meu corpo de guerreiro... Ta bom, cheio de rugas e varizes dizendo, ocê num si importa de ieu ir pelado? Ela olhou aquele velho corpo até interessada e parou o olhar na meia porção, “é a parte do corpo que nunca traiu este poeta”, o safado estava empinado e pronto para ver se sobrava alguma beiradinha para ele.
Ela disse com a voz mais doce do mundo parecia uma cascata de águas límpidas murmurando poesia em altas horas: - que maravilha, que lindo, que coisa mais bela é o ser humano. – Ocê gostô do piquitim? Qui bão cocê gostô, sô cê quisé, ele ta quereno.
- Não meu trovador caipira, lindão dos olhos azuis, eu gosto é de ver às emoções dos seres humanos, sabe Trovador, eu já fui viva e assumi esta função depois que morri, e sei como é ter emoções e é nisto que eu quero que pense, quando eu levar você, não vai mais sentir emoções de ver as belezas que o cercam, não ouvirá mais o canto dos pássaros, não sentirá mais o frio, o calor, o contato com a água, não sentira o perfume das flores, nem vai sentir o paladar das coisas gostosas. Vai se juntar a outras energia especiais e não lhe será revelado o que será de você.
Pense nisto, não ouvirá estas músicas lindas do Roberto Carlos, Caubí Peixoto, Nelson Gonçalves... - Xi dona morte ocê tá atrasada, nóis agora se quisé iscuitar moda mais o meno, nóis tem de se agarrá cas moda caipira da roça, purque as da cidade agora, caipira se chama música universitári e é uma lenga lenga de letras sem nexo, assim ó: “Ocê mim provocô e rebolô pertu de mim, depois nóis ficô garradim garradim e aí o cantador grita, balancem os braço e fica a pratéia tudo com oiá de besta tonta balançando us braço prum lado e pru outro, e se num fô essas tem de iscuitar o tar de Rep Rip Rap e Rop presta mais não.
Intonces posso ir peladim mermo? – Meu Trovador eu não posso te levar se não ficar com medo, pense nisto, vai perder todas as suas faculdades e emoções e vai ficar lá misturada com outras energias esperando sem sentir nada. Não tem medo? - Se vancê vai ta lá eu tenho medo não, já quero é ir, vamo? – Não, vou embora, quando ficar com medo venho de novo e começou a desparecer.
Aí eu gritei ela se firmou de novo: - vêm, cá sô, entra aqui dibaxo do cubertô, tarveiz ieu cunsigu passá um poco de emorção procê, vem. – Trovador, nem conseguiria me abraçar, sou o foco de um elograma uma espécie de imagem projetada, se tentasse me abraçar eu apenas entraria no seu corpo ou o envolveria em luz. – Mais já tá bão vem cá. – ela foi desaparcendo e ainda disse quando ficar com medo venho buscar você, prometo.
Fiquei desolado, queria ir, choraminguei: - ispera belezura, vem cá vomo tentá, tô percisano, o méia porção tá quereno, eu tô muitu afim. Vai simbora não, vorta ieu te amo, tô te quereno. - Malvada se foi e não me levou e o pior que aí não consegui dormir de novo, Chato isto.