PACIENTE SEM ÉTICA

PACIENTE SEM ÉTICA

Os pajés, sacerdotes, padres, alquimistas, curandeiros e até o “grão vizir”; todos tinham conhecimento das doenças do corpo e da alma. Eles eram especialistas em tudo, comandavam nações através dos seus conselhos. Para manterem seu poder precisavam ter respostas para tudo incluindo as respectivas soluções. Quando não identificavam a doença através dos sintomas, bastava rezar ou buscar inspiração na fumaça de um cachimbo, ler coisas na borra de café, promover sacrifícios no altar, canalizar as energias pela força do pensamento. Tentavam todos os recursos ao seu alcance intelectual, místico até intuitivo. Se não desse certo de um jeito, teria que ser de outro. Mas tinha que dar certo, um erro poderia custar-lhe a vida!

Muitos anos, séculos se passaram, tudo evoluiu e houve uma especialização nessa área... dos médicos? Não! Dos pacientes, que não são nada pacientes em se tratando de própria cura. Especializaram-se em multiplicar doenças, camuflar causas, ou criar sintomas. Tantas dores e sofrimentos indeterminados que o corpo precisou ser estudado em partes (como diria Jack o extirpador). Somente assim para compreender os danos que fomos capazes de infringir aos nossos próprios órgãos. Dessa maneira o pajé de ontem tornou-se oftalmologista, cardiologista, ortopedista e muito mais; os sacerdotes que se preocupavam mais com a alma transformaram-se em psicólogos, psiquiatras, neurologistas. Já os alquimistas provavelmente são os homeopatas de hoje, quem sabe!

Na verdade, o que não podíamos dizer contra os médicos durante tanto tempo devido a sua influencia política, descontamos hoje. Maldizemos tudo o que nos dizem sem saber como questiona-los com segurança, no fundo, sabemos que eles sabem mais do que nós e somos nós que não sabemos nada, o vocabulário técnico nos atordoa. Reclamamos quando nos passam a outro médico, como que transferindo o problema por não ter competência suficiente para dar uma solução e não por se tratar de algo mais específico que a sua especialidade. Também, tendo pacientes, assim bondosos como nós, inventores de sintomas impossíveis de serem catalogados com eficácia. Ficam confusos e para não deixar-nos a cargo de nós mesmos nos encaminham aos seus colegas especialistas. Talvez os médicos devessem se chamar pacientes e os pacientes pseudos-médicos.

Quando somos diagnosticados por um medico jovem, desconfiamos da sua inexperiência; se o médico for mais velho julgamos que esteja ultrapassado. Como nenhum deles nos passou a um “especialista”, vamos por conta própria a fim de obter uma segunda opinião. Chegando ao especialista, descrevemos o que sentimos sem dar muitos detalhes, afinal ele é o especialista, tem que saber o que eu tenho sem minha ajuda. Coitado, além de estudar feito louco, fazer residência, plantões, tem que saber ler mentes e ainda adivinhar o que não queremos dizer. Se o diagnóstico for diferente do clínico, ao sair do consultório, fazemos aquele comentário malicioso: _”Sabia que aquele doutorzinho não sabia nada! _ Gripe que nada, pneumonia sim e nem precisei abrir a boca”!

É preciso ter muita paciência para exercer a medicina, é uma profissão muito exigente. Quando o doutor nos recebe como pacientes já estamos sem paciência alguma. Essa teoria que adotamos de que o médico não acerta nada, nos faz ir ao consultório depois de termos tentado todos os remédios caseiros. O que era dor de cabeça se tornou enxaqueca. A enxaqueca de tão aguda nos fez vomitar. Aí não sabemos ao certo se a causa de tudo foi a cabeça ou o estômago. O organismo sabe nos mostrar que algo não esta bem. Febre, pressão alterada e a dor que estava na cabeça se espalharam pelo corpo. Será que realmente podemos nos chamar de pacientes diante de tudo isso? Nós os pacientes de casa, nos tornamos os impacientes na rua! O médico que começou o atendimento bem cedo de bom humor recebeu sabem-se lá quantos clientes iguais ou piores que nós, deveria estar com que humor no fim do dia? Claro nem sempre somos os piores, só quase sempre! Porque os melhores, os bons não adoecem, no máximo tem um mal estar! É bem provável que esse médico depois de todos nós também terá que se consultar com um colega.

Mas vida de médico é assim mesmo, são pagos para isso, ele tem que nos servir! Coisas ainda piores ainda podem acontecer, frequentemente discutimos com ele o remédio, composição química, dosagem, laboratório, genérico, preço, ou seja, o médico já precisa saber sobre os direitos do consumidor e ter em mãos uma pesquisa de mercado. Desconfiados dele, procuramos o farmacêutico de confiança tanto a recita quanto as recomendações médicas. Em casa seguimos parcialmente segundo fomos orientados, tomamos os medicamentos quase no horário, esquecemos um ou outro. Na sexta-feira interrompemos a caixa porque já estamos nos sentindo bem e não dá para dispensar a cervejinha do fim de semana. E ainda difamamos o profissional paciente que nos atendeu, acusando-o de esquecer o juramento de Hipócrates. Em qual faculdade será que aprendemos a nos adoecer, quantos anos de teoria e prática tivemos para obter o diploma de chatos?

Não esquecemos que quando estamos bem, bem lembramos que os médicos existem. Passar em porta de hospital trás má sorte! Então temos duas escolhas: não ficar doente ou ser um doente paciente. Assim como os médicos respondem a um código de ética médica, também os pacientes deveriam ter. Minhas sugestões para não adoecer são as seguintes:

a) Desde cedo, aprenda que de desobediência sempre traz conseqüências como culpa e castigo. A culpa de não sermos descobertos gera taquicardia, insegurança e reflete na garganta, por não dizer a verdade. Já o castigo e merecido, portanto não revoltar-se; por não ser tão esperto quanto pensava; evita dor de cabeça e febre.

b) Aprenda a respeitar opiniões contrarias as suas. Contrariedades geram irritações, raiva e afeta a pressão arterial. Ai e só se descuidar um pouquinho da saudade e você ganhara um aneurisma, parada cardíaca e como troféu algumas pontes de safena.

c) Não espere que as outras pessoas reconheçam ou agradeçam o que fez por elas, se não a tristeza poderá te alcançar. E toda vez que você se lembrar, a magoa vai circular em sua corrente sangüínea, hipoglicemia etc... na verdade, faça por você.

d) espera o ônibus, ficar oras no fila do banco, transito congestionado, podem fazer com que fiquemos impacientes, nervosos, prontos para entrar em erupção como um vulcão. Mas se a lava deslizar internamente ulceras e gastrites iram te acompanhar para o resto da vida.

e) preste muita atenção ao que você anda olhando ou ouvindo dos outros. Acalentar maledicências pode nos causar surdes, assim como, não vigiar a própria vida pode prejudicar a córnea por uma catarata.

f) Cuide para que seus braços apertem carinhosamente; que suas mãos acariciem; as pernas enfrentem os desafios e seus pés sigam o caminho do bem.

g) Lembre-se que todos somos falíveis. E nossa pior falha e acreditar que estamos sempre certos, por tanto releve, perdoe. Não queira contaminar suas células com câncer para que elas dobrem seu orgulho.

Tenho certeza que você não deseja nada disso a ninguém, muito menos a você mesmo. Logo, vale a pena buscar uma vida mais saudável emocionalmente falando para que o seu corpo não apresente efeitos que poderiam ser evitados. Não perca tempo, mude seu comportamento. Se as conseqüências citadas não te assustaram, acredite que existem muitas mais. A ciência a cada dia descobre novas. Mas se apesar de tudo isso, se não conseguir mudar os velhos hábitos, terá que aprender como adoecer. Ai e melhor estar preparado para ser muito paciente, pois o corpo pode não responder tão rapidamente ao tratamento quanto você aos seus descuidos.

Ah! Não se esqueça: se não quiser se tratar primeiro de dentro para fora (o que depende só de você) terá que se conforma com um medico para tratar os sintomas que estão por fora.

Gabi Borin