Solitário na multidão

Admiro os solitários. São, normalmente, uns tipos esquisitos que você observa, mas não consegue tirar nada do que viu. Eles se mantêm sozinhos, não por arrogância ou algo parecido, e sim porque não estão no mesmo compasso que os "normais". Não conseguem, e nem tentam muito porque não têm saco, se misturar com a multidão. O verdadeiro solitário vive a angústia de ter que estar nesse planeta. Está longe da felicidade na maioria das vezes — o que deve ser algo difícil de se lidar —, mas sabe que essa é a sua sina e a encara com estranha paixão. É claustrofóbico por natureza, como se estivesse sendo sufocado o tempo todo por algo que nem ele próprio nem o melhor psiquiatra sabem dizer o que é. Deve se admirar uma pessoa assim, não? Creio que sim.

Já de mim mesmo, não posso ter tanta admiração, nem conseguiria. Solitário por natureza, na verdade, sou muito covarde para assumir a minha condição perante o mundo. Mantenho a minha máscara de pessoa normal, a minha felicidade nos momentos em que o que eu queria mesmo era gritar, como grita quem precisa de ajuda rápido; alguma coisa urgentemente. Posso dizer que sou a escória dos solitários. Se existisse um "Clube dos Solitários", certamente seria expulso por não ser digno o suficiente para pertencer a tal grupo seleto. Mas o que será que me impede de assumir de vez a minha condição de pessoa sozinha? Não devo ser só eu nesta situação embaraçosa. Mas devo ser, sim, um dos poucos malucos a quem isto de fato incomoda, a ponto de me fazer escrever um monte de palavras que podem parecer até sem nexo sem motivo nenhum. Afinal, nem o meu pai deve ler este texto. Ele não perderia o tempo corrido dele, eu acho, apenas para comprovar que seu filho está se tornando cada vez mais paranoico e doido.

Mas pensando um pouco, nesse meio tempo em que escrevo esta lauda, chego a um esboço de conclusão — porque um esboço é o máximo que um solitário frustrado como eu pode atingir, nada definitivo. O que eu tenho é um puta medo! Medo que me faz tentar ser normal sempre que dá. Ainda bem que esse medo não é só meu — não suportaria viver sozinho com isto na cabeça. Todo mundo tem medo. É isso que move o mundo e faz as pessoas viverem, afinal, se não houvesse o medo, não haveria a coragem não é mesmo? O problema é que existem pessoas que veem o medo e o atropelam, o encaram. Eu recuo, saio fora. Não tenho saco e nem vocação para bravo. E o movimento tão vago e confuso das coisas me deixa tonto, chapado, estático. Como se nada pudesse ser feito, como se o trem tivesse passado e eu não tivesse entrado. E aí, o que me resta é continuar. Pra onde? Queria muito saber, mas não tanto a ponto de sair da minha condição de solitário covarde que sou. E aos não covardes, aos que me referi no começo desse trecho, fica a minha mais sincera e profunda admiração.

Jova
Enviado por Jova em 12/04/2017
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