A SOLIDÃO DE UM LOBO *

Ao amigo cronista Big Ben

Como em um espetáculo triste, estou vivendo. Não quero com isso, dizer lhe, que minha vida, virou de vez. Estou fugindo de tudo, que um dia acreditei que merecia ter, pelo menos um pouquinho. Hoje, com mais idade que outrora, e com o amadurecimento adquirido ao longo de todos esses anos, reconheço em fim, que posso seguir sozinho o meu caminho, sem mais nenhum desassossego. O inferno, meu nobre amigo, talvez seja, exatamente a companhia que nos ladeia, não essencialmente a solidão. Nesse tempo que passei a conviver comigo mesmo, cheguei à conclusão de que a solidão às vezes dói bastante, mas, para quem ainda não sabe viver, para quem não é capaz de conviver consigo mesmo, para os que ainda não se amam ou não se valorizam ou não se respeitam. Segundo Aristóteles, “o homem solitário é uma besta ou um Deus". Besta, por não saber usar de sua inteligência, em seus momentos de solidão, para pensar melhor em como dar novos caminhos a sua vida. Por não saber usar corretamente sua solidão, para refletir um pouco, em como ser mais útil a humanidade, que carece tanto de novas idéias que venham solucionar, inúmeros problemas sociais, entre outras tantas coisas que nos motivam a seguir em frente, em busca de um novo dia. E Deus, por pensar que é único nesse tão vasto mundo oco, onde tantos se matam por coisas tão mesquinhas e fúteis. Por pensar que sendo Deus, podem mandar e desmandar, a torto e direto, por se elevarem a cima de tudo e de todos, sem nunca reconhecer seu devido lugar perante a multidão que o rodeia. A solidão por mais doída que venha ser, ainda assim, continua a ser melhor que muitas companhias que nos ladeia. Em sua solidão, Adão, clamou ao Senhor uma companheira, pois imaginava estar isolado de tudo e não tinha com quem compartilhar todo aquele esplendoroso Jardim do Éden. Assim, o Senhor Deus, resolveu lhe atender e deu lhe uma magnífica mulher, a mais bela, de tudo o que os seus olhos, já haviam visto em toda a sua vida. Infelizmente, Adão, no entanto, jamais imaginaria que, aquela tão linda mulher, seria o seu próprio fim. Pois o inferno, meu caro amigo, talvez seja exatamente a companhia que nos ladeia, não essencialmente a solidão. Muitas vezes, somos traídos, até mesmo, por nossos próprios pensamentos. Deus, em sua plenitude, não agiu com o intuito de lhe destruir, mas com o infinito desejo de lhe ver plenamente feliz, pois é essa, a nossa única finalidade aqui na Terra. Porem, sua tão bela companheira o seduziu e o fez provar do fruto proibido. Sansão, com toda sua potencia, com toda sua grandiosa força, deixou ser enganado e destruído pelo desejo da van atração que sentiu pela beleza e o encantamento de Dalila, que o enfeitiçou levando o a sua trágica ruína. Romeu, mesmo sendo bastante jovem e inteligente, também foi levado á morte, por ter deixado se levar pelo amor de Julieta, sua tão amável companhia. Não somente, esses poucos exemplos que lhe ofereço, como outros inúmeros, que certamente, você, meu caro amigo, deve conhecê-los melhor que eu, é o que me leva a crer no que lhe digo: - A solidão por mais doída que venha ser, ainda assim, continua a ser melhor, que muitas companhias que nos ladeia. Estar consigo mesmo, é estar acima de tudo, na presença do imponderável. Viver sozinho, não quer dizer que seja uma forma de egoísmo, não quer dizer que somos como ilhas, ou, de se querer tudo somente para si, de ser indivisível. Pois as pessoas que estão por vir em nossas vidas, nós nunca saberemos, se estas nos serão um poço de abundante felicidade ou um infinito deserto que nos levará a nossa ruína. Aquele que não se sente bem em estar sozinho, certamente é pelo fato de ainda não ter aprendido como desfrutar de sua própria companhia e pela carência que o sufoca pela falta de alguém á seu lado. A solidão e o silencio, nos liberta de muitas coisas que em companhia de outra pessoa, nós, não conseguiríamos, mesmo passando por processos médicos e/ou científicos. A solidão é companheira, é passiva, é o momento de reflexão que nos liberta e nos faz meditar. É na solidão que surge às grandiosas criações, as obras primas, os grande romances, os mais belos poemas, as mais lindas melodias, a cura para tantos males que nos apavora, em fim, é na solidão que buscamos o tempo necessário para nos libertarmos de nossos pesadelos, para começarmos a sonhar. “O estar só é um bem necessário na vida dos humanos enlouquecidos por companhia.” È necessário que conheçamos mais a solidão e saibamos conviver com ela, pois só assim, é que saberemos como viver melhor em comunidades e na sociedade. Quem curte a solidão e a vive em seu dia a dia, tem se muito mais habilidade, para criar os grandes inventos, são capazes de conseguir coisas jamais vistas antes pela humanidade, pois a solidão é o ingrediente essencial da criatividade. A solidão nos liberta, através de nossos pensamentos, dos maiores presídios e das inquietudes de nossas almas, pois, ignorando as muralhas das prisões ou as frias paredes de nossas celas, passamos assim, - como o escritor russo, Destóiewsky, que escreveu sua grande obra, em um presídio, - nós também, a escrever partes de nossas vidas, aí mesmo, na prisão, que ao contrário do que muitos pensam, possa vir a ser uma forma prazerosa de nos libertamos do mundo exterior, para buscar a liberdade em nossos próprios pensamentos, de onde surgirão grandes obras primas. A solidão ou o estar só, não implica em falta de gente para conversar, para beijar, para fazer sexo, para um passeio ou até mesmo para um bom diálogo. Muitas vezes isso passa a ser o sinônimo de carência e de falta de amor a si mesmo. Podemos estar no meio de uma multidão de pessoas, e ao mesmo tempo, não tendo com quem conversar nos sentiremos isolados do mundo todo, e isso, eu já senti na própria pele e posso lhe dizer com franqueza: - Não é nada agradável, saber que em meio a tanta gente, muitas vezes não encontramos uma só pessoa a quem confidenciarmos nossos objetivos ou nossos desejos. Já provei de lábios tão frios e transei com corpos tão gélidos e mórbidos, que senti minh’alma se afastando de mim num momento de desgosto e profunda dor. A ausência de nossos entes queridos, não se tornara em solidão, uma vez que o mantivermos vivos dentro de nossos corações, pois o que se foi, o que partiu, foi somente o corpo físico, a matéria. A memória ainda há de prevalecer por mais alguns anos, dando seqüência á sua história de vida. E esse sentimento que experimentamos, não deveria ser chamado de solidão, mas sim, de ausência, daqueles que partiram para não mais voltar. E á isso eu chamo de saudade, não de solidão. O retirar se voluntariamente, para alinhar os pensamentos, não implica em solidão, a isso também eu chamo de preparação para um equilíbrio, não só da mente, como também do corpo. A solidão não é a falta de pessoas do nosso lado, nem tampouco é o retiro involuntário que o destino nos impõe para que revejamos nossos conceitos de vida... A solidão, não é dor, não é vazio, não é desespero, não é tristeza, como também não é a mera falta de pessoas ao nosso lado, pois, talvez seja exatamente essa companhia que nos ladeia, a responsável pelo nosso fim, não essencialmente a solidão. A solidão é muito mais do que possamos imaginar. A solidão é quando nos perdemos de nós mesmos em busca de nossa própria alma, e passamos a vagar dentro de nosso interior aflito, como a um lobo solitário, que vagueia noites adentro em busca de uma presa, para assim, saciar sua impiedosa fome.

Estação do Cercado (MG), 11 de abril de 2017.

Tadeu Lobo
Enviado por Tadeu Lobo em 12/04/2017
Reeditado em 02/06/2017
Código do texto: T5968376
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