A Lua e Júpiter

Eu sei que normalmente não adianta criar expectativa, já que todos os grandes fenômenos astronômicos em Curitiba se dão sob uma espessa camada de nuvens, mas a verdade é que dessa vez eu vi, meninos, vi muito bem, a lua praticamente cheia e, acima dela, coisa de dois ou três dedos, uma estrela brilhante que não era estrela coisíssima nenhuma, mas o planeta Júpiter. Júpiter! Visto a olho nu aqui do meu condomínio! Ah, meus amigos, confesso que fiquei muito tempo olhando com cara de bobo para tudo aquilo, como é que pode, eu, vendo Júpiter em casa!

Claro que não foi todo mundo que compartilhou do meu entusiasmo, isto é, uma ou outra pessoa até foi lá olhar depois que eu avisei, e olharam, viram, enxergaram, e até acharam interessante, mas o que não dá é para ficar o tempo todo parado vendo duas esferas no céu, não é? E voltaram a fazer o que tinham interrompido. Mas eu não! Eu saí de casa e procurei um lugar bem isolado com o claro objetivo de namorar, e namorando fiquei, e só não cheguei a uivar porque milênios de domesticação já haviam refreado em mim esses instintos mais primitivos.

De certo também não tem nenhuma novidade no fato da Lua se encontrar com Júpiter, os dois devem fazer isso volta e meia, mas devo dizer que apenas no ano passado o véu se rasgou, a realidade se descortinou na minha frente e eu descobri, vejam só, que havia um Universo diante de mim. Sou, pois, como uma criança, tenho a curiosidade de uma criança, a excitação de uma criança, e todas as coisas para mim são uma profunda novidade.

Esta também é uma noite incrivelmente estrelada para os padrões curitibanos, tanta coisa para olhar, ah, o Calvin é que estava certo, se as pessoas saíssem toda noite para olhar as estrelas, de certo viveriam bem diferente.

Olho para aquele pequeno ponto luminoso, admirado de que, na realidade, ele seja um grandalhão, dentro do qual cabem 1.334 Terras, cabe uma Terra inteira só dentro da grande mancha vermelha de Júpiter. Não tem vida lá, não pode ter nada lá, é apenas um gigante gasoso, mas como nos serve esse gigante, como trabalha bem esse grande aspirador de asteróides. Devo-te muitas, parceiro!

Hoje podemos olhar para o céu e saber exatamente o que está acontecendo. Isto é, quantos anos tem a ciência moderna, 400 anos? Pois é, nesses 400 anos a gente já aprendeu um bocado de coisa sobre o sistema solar, sabemos dizer com certa precisão do que esses corpos são feitos, quais as leis que atuam sobre eles, como eles interagem, como se comportam e até como se comportarão. E, no entanto, é sempre o mesmo pasmo, o mesmo espanto de uma primeira vez que nos toma diante da Lua e diante da imensidão do Cosmos. Ah, meus amigos, é por isso que toda a nossa ciência ainda não conseguiu acabar com esse sentimento religioso, esse desejo de adoração, essa vontade de pertencimento a algo maior que nós.

Mas vejam como são as coisas! Eu fiquei falando aqui com vocês e agora, quando fui outra vez observar a Lua e Júpiter, já não consegui ver mais nada: está tudo tomado pelas nuvens! Ê, Curitiba, hein? Mas não tem nada não, dessa vez eu vi. E faltou pouco para uivar, viu?

Henrique Fendrich
Enviado por Henrique Fendrich em 10/04/2017
Reeditado em 10/04/2017
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