CAUSO DA SOVA NO TENENTE

Santa Maria da Vitória é palco de todos os tipos de acontecimentos, históricos e fictícios tendo como trilha sonora os barulhos das águas do rio Corrente e os seus filhos e moradores em geral como grandes personagens. O texto a seguir Antes de começarmos a nossa história de fato, mencionarei um trecho do conto, “Nossa Senhora Aparecida, Um Conto de Fé e milagre” como prefácio.

“esteve com Renato de Naná, com Robertinho de Dizinha, com Tonho de Palu, Toginho de Protógenes e outros amigos e conhecidos da cidade. Sempre se esquivando das perguntas sobre a saída dele do Sacerdócio. Com os amigos e ex-colegas ele até deu muitas risadas, quando Renato lembrou a ele a história do passado, quando a turma era coroinha da Igreja da Cidade, e comandados pelo Athaydinho, todos foram obrigados a tomarem o vinho da missa esvaziando as garrafas, e quando a Vanda, Beata zeladora da igreja chegou para pegar o vinho, não encontrou nada mas, sentindo o hálito dos coroinhas deduziu rapidamente o que havia acontecido: - Cambada de presepeiros, o que vocês fizeram ! Deixa só os pais de vocês ficarem sabendo! Gritou com bastante fúria e indignação com o que a molecada havia aprontado.”

Agora voltemos à nossa história. Quem nos contou esse causo, foi o grande Waldemar, O Dema do SAAE, grande zagueiro da nossa seleção em uma roda de conversa no Jardim Jacaré, na Praça do Réptil, e a história teve como cenário o próprio Jardim Jacaré, mas apenas o local, já que a praça ainda não estava concluída, talvez nem começada.

Era início dos idos anos de 1960! A pequena hidrelétrica de Correntina estava em fase de construção, hidrelétrica essa que iria alimentar com eletricidade as cidades mais próximas da cidade de Correntina, como Santa Maria da Vitória, Santana dos Brejos, Bom Jesus da Lapa, Carinhanha, Cocos, etc.

Geralmente os sacos de cimento para a construção da hidrelétrica vinham normalmente do Estado das Minas Gerais, e eram transportados pelas grandes embarcações como gaiolas e rebocadores, descarregados no cais de Santa Maria da Vitória e depois, numa nova etapa, transportados de caminhões para a cidade de Correntina onde a barragem, apelido chamado por todos nós, estava sendo finalizada.

Sempre que havia descarregamento e carregamento de sacos de cimento, algumas embalagens pelo manuseio acabavam estouradas e com isso, na beira do cais, uma quantidade enorme de papelão rasgado se acumulava e era justamente com essas embalagens rasgadas que a molecada preparava uma arma de combate para as brincadeiras noturnas.

Fazia se uma bola de papelão e a colocava presa na ponta de um pedaço de vara ou um pequeno bastão para a contenda noturna, com a molecada montando mais de uma equipe para a guerra de pancadas de bolas de embalagens. Não havia luz elétrica na cidade, por isso a construção da barragem estava sendo executada, e a diversão nas ruas, todas cheias de areões, pois não havia quase calçamentos, eram as brincadeiras inventadas que davam o tom da diversão, como essa da briga das bolas de papelões.

Era de praxe a turma durante o dia jogar futebol na areia, nadar no rio Corrente, brincar de bola de gude, empinar pipas, mas na noite, até certa hora, principalmente em noites de lua cheia, as brincadeiras eram intensas.

Quando não havia noites enluaradas, aproveitavam-se as luzes das candeias que saiam das portas e janelas das casas, enquanto os adultos ainda estavam nas rodas de bate papos nas frentes das casas.

Em Santa Maria as novidades, muitas vezes aconteciam de maneiras inusitadas e de supetões. Mas sempre eram novidades que ficariam para o resto da vida na memória de quem a vivenciou, e neste caso o Dema e a turma da sua geração. Eu não estava presente, mas juro que gostaria de estar para ver de perto o que de fato aconteceu naquela noite de brincadeira.

A turma já estava preparada para a contenda! Não me foi explicado se os times da brincadeira representavam a rua de cima e a rua de baixo! Na verdade vou me ater ao fato narrado pelo Dema sobre a noite, engraçada e ao mesmo tempo séria! Séria porque houve um envolvimento seríssimo para os padrões daquela época, afinal de contas não se desfaiava a autoridade máxima ou autoridades máximas.

A brincadeira começava a todo vapor! Melhor, a toda poeira de pó de cimento, afinal de contas as embalagens residuais estavam carregadas de cimento. A ordem de largada estava dada! De repente ouve se uma voz emergir da escuridão:

- Parem já com essa brincadeira maluca e imbecil, rapaziada!

Todos olharam um tanto quanto boquiabertos. Afina de contas, quem era aquele desconhecido intruso que ousava jogar água em uma brincadeira tão divertida! Pela claridade translúcida só se via a silhueta do alienígena noturno. Acabar com as brincadeiras noturnas da rapaziada ninguém nunca ousara fazer antes e então por que aquele sujeito estava se metendo agora?

- Pau nele pessoal! Gritou a voz do líder, neste caso o Waldemar, que sempre atendeu pela alcunha de Dema, mais tarde Dema do SAAE, zagueiro fantástico da seleção da cidade que nos encantava nos anos 1960 e que mais tarde tornou-se um grande amigo e colega de escola.

Após tal ordem, as equipes num só time arremeteram contra o intruso desconhecido e penetra, e a saraivada de pancadas de bolas de embalagens de sacos de cimento cheios de pó cobriram o alienígena de cima a baixo até que se ouviu outro grito, mais forte, mais carregado de surpresas e grande receio.

- Caramba, é o novo tenente que chegou a cidade para comandar a delegacia de polícia!

Nesta época, até meados dos anos 1970, as delegacias de polícias das cidades eram comandadas por tenentes da polícia militar. Tivemos o Tenente Raimundo, Tenente Joaquinzinho, Tenente Trovão e quando sai da cidade tivemos o Tenente Sobreira, e o tenente que casou com a tia da Norminha de Jairo, cujo nome não me lembro, mas lembro me bem de ele ter atirado no pé do então soldado Zé de Mário que o contrariou em certa ocasião de indisciplina de comando.

Bem, retornando à nossa história, quando descobriram em segundos, que aquele intruso desconhecido e penetra seria a pessoa mais conhecida do mundo, e em questão de minutos os times se retirarem como um raio fulminante. Nunca na história se viu uma debandada tão instantânea como aquela!

Todos os envolvidos correram para as suas casas e Dema, não seria diferente, correu para a casa dele. Segundo ele o pai comentou:

- Dema aqui a essa Hora!

Não durou quinze ou vinte minutos para o Dema ouvir os gritos do seu pai e segundo ele o pau cantou ali dentro de casa e eu acredito que na maioria das casas de muitos outros contendores da brincadeira. Confesso que o errado de toda essa história foi o tal tenente que se tivesse se identificado nada disso teria acontecido e eu não teria ouvido a narrativa do amigo Dema, e não estaria recontando essa história para vocês agora. Espero que as pessoas que participaram daquela noite extraordinária complete essa história com dados mais reais, afinal de contas eu não a vivenciei, mas que gostaria de ter estado lá como espectador, isso lá eu gostaria e como!

( Do livro Causos Correntes)