Papo Secreto

Gostava de conversar com si próprio. Era o que chamava de papo secreto. Admitia que, não raro, nesse exercício reflexivo derrapava para os sonhos, para o mundoirreal, virtual e, claro, impossível. Mas como alguém pode vivwer sem sonhar? Quem nao sonha, quem não exercita a fantasia por alguns momentos, é alguém perigoso, não tem sensibilidadee nem sentimentos. Sonhar é um sentimento nobre. Faz parte do show dqa vida. Para sonhar ninguém paga imposto e nem precisda pedir autorizaação a nenhuma "otoridade". Como gostava de ficar divagando!, era comose estivesse navegabdopor mares nunca dantes navegados. Lembrou-se da letra linda de Chico Buarque que falaq do faz de conta das crianças: "Então eu era o herói e o meu cavalo só falava inglês, a niva do caubói era você e mais outras três". Só que na sua divagação não se limitava só a infância, avançava por outras fases da vifda, distorcendo, aumentando, enfeitando o maracá, se divertindo muito. Mas aproveitava também esses momentos de devaneio para rir de si próprio, das suas gafes, fraquezas, pequenas maldades e ,,, derrotas. Não escondia, não acobertava seus deslizes. Pelo contrário: gostava de lembrá-los e de sofrer com os erros, achava que esse reconhecimento era uma forma de redenção. Pelo menos um começo. Não que se sentisse absolvido, mas certamente esse exercício lhe trazia um alívio. Era um baita de um paliativo.

Pensou nosw seus heróis, alguns ceios de defeitos, outros de pés de barro, com os seus tropeços. Na Hora H, todos homens comuns feitos do sopro e do barro divinos, sujeitos às mesmas fraquezas. E alguns com seus rabinhos presos. Mas, agora, ele estava realmenteadmirando e achando que o maior líder do mundo era o papa Francisco. Não havia ninguém com uma pregação mais revolucionária no que tange ao social. ninguém mais empenhado em defender os oprimidos e os excluídos. Lembrou uma frase doa papa: "Deus perdoa sempre, os homens às vezes. mas a natureza nunca perdoa". Quanta verdade!, pensou. Lembrou outra frase, esta de um escritor francês. Malraux: "Há mais dores no mundo do que estrelas no céu. E eleque fazia de prático, de objetivo, para lutar contra as dores do mundo denunciadas pelo papa e pelo saudoso escritor? Quase nada, apenas falava, às vezes escrevia, comentava... E essa impotência lhe doía muito, tinha consciência das injustiças pfraticadas ao seru redor, era consciente, mas não tinha meios, nem frça, nem pelo menos saúde...

Ainda pensou nos seus projetos pessoais em que fora derrotado, as viagens que anão fez, os livros que escreveu e não conseguiu publicar, nas esperanças fenecidas, nas decepções, contrariedades, injustiças que sofrera. Mas tudoisso era coisa de somenos importância no contexto da vida. A vida como cantara o compositor Gonzaguinha: "É bonita!É bonita! É bonita!", É um dom de Deus, um p~rêmio, uma espécie de megasena da virada. Sim, riu, era um vencedor, vencera um enorme batalhao de espermatozóides! Como, pensou, era gostoso viver. Sabia que a vida era finita, afinal nãovivia em Shangri-la, mas a vida era linda, fantástica, bela, belissima. Em todas as suas fases.

Foi ficando cansado. Que papo mais cansativo e besta, pensou divertido. SSentiu os olhos querendo se fechar. Levantou-se quase a pulso, saiumeio cambaleando, bambo, se arrastando e foi à cozinha, tomou um copo d'água, foi ao banheiro, se aliviou, e aí foi para a cama. Deitou-se onde já havia, no colchão, uma baixa, sentiu o rosto em contato com a fronha do travesseiro, aquele cheirinho inconfundível, deu boa noite ao travesseiro, seu amigo e confidene fiel, deu graças a Deus por estar vivo, e então adormeceu, quem sabe sonhou com um novo dia, um dia feliz. ra um caboclo sonhador. Inté.

Dartagnan Ferraz
Enviado por Dartagnan Ferraz em 30/03/2017
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