CAMINHADAS

Tenho aproveitado estas férias para fazer umas caminhadas já que em outros meses não tenho tempo. Assim, me delicio em acordar mais cedo para pôr em dia a forma física. Sempre tenho dito: só sabe o quanto é gostoso fazer caminhadas quem as faz.

Acordo as seis, ponho um tênis, pego um cronômetro e sigo rumo ao Parque de Exposições Major Hildeberto Barroso. Percebo que sou o último, uma vez que quando vou todos já estão voltando. Mas não me arrependo, acho que faz parte do meu prazer tomar aquele solzinho ardente no rosto.

Para algumas pessoas caminhar é um dever: prescrição médica, necessidade de perder peso,

diminuir colesterol, triglicérides, etc. Para mim é diferente. Caminhar é prazer.

Enquanto caminho e acordo as estruturas físicas, ponho em dia algumas conversas com minhas estruturas psíquicas, - sempre tenho caminhado solitário. Aproveito o tempo e a paisagem para um gostoso ato contemplativo.

Manhãs de julho sempre apresentam um céu belíssimo e uma brisa suave. Por entre leves chumaços de nuvens alvas a lua minguante me espia com seu magnífico olhar prateado. As carnaubeiras que margeiam a avenida Esaú Alves me lembram muito o ambiente do sertão que conheci ainda criança. E tem mais: tenho visto floridos pés de pau-mocó, oiticicas, e até uma grandiosa timbaúba me tem dado saudades de tempos passados.

Entretanto, o que mais me tem causado admiração são as espécies da nossa fauna. Pude nestes dias admirar a presença de anus, piriguás, bem-te-vis, severinos, cavaleiros. Cada um com seu canto inconfundível. Com seus enormes bicos vermelhos e canto que mais parece uma risada, os bicos-de-latão. Rolinhas sangue-de-boi, a rolinha pombinha com seu canto apressado, a rolinha branquinha com seu tristonho furão. Numa ingazeira branca às margens do Riacho das Almas avistei hoje, um belíssimo martim-pescador. Cabeça e bico pretos, gola alva, peito vermelho e gibão verde. Um espetáculo. Ontem, cheguei a ouvir o piado de uma jaçanã e o apressado canto martelado do grande pica-pau de cabeça vermelha.

De todos porém, o que mais me impressionou e surpreendeu foi ter avistado um pequeno bando de, acreditem, anu grogolô. Enorme todo, especialmente a cauda. Preto tão intenso que sob os raios do sol alude a cor azul. Canto estridente, extravagante. Lembrei-me de quando ainda criança e sem condição alguma de perceber as conseqüências da prática extrativista, caçávamos nas moitas de mofumbo nas croas do Garrotão, seus ninhos repletos de ovos.

É incrível. Como a natureza é valente, persistente. Jamais imaginei encontrar tantos tipos da nossa fauna tão perto do asfalto e barulho dos motores. Entretanto, com um aperto no peito eu me pergunto: até quando resistirão?