Talvez faça você chorar...

Todos os dias a professora acorda de madrugada para cumprir suas obrigações e lecionar. Devia passar o ônibus, mas o ônibus não transita pela rua onde ela mora. Quando desaba o temporal se encaminha para o ofício debaixo da sombrinha vermelha. Há vento, negrume e chuva. Caminha um longo trajeto para alcançar o ônibus. Segue pensando nos seus pequenos alunos, expostos a intempérie, como ela, debaixo da chuvarada. Longe as crianças seguem das casinhas humildes deste país campo afora até o começo da estrada. Encharcados. Os pés roxos de frio, mal o dia amanhece. Por sorte existe comida na escola nunca faltando criança com inchaço na barriga dizendo.

- Comi demais. E com gula: Tem mais um pouquinho?

Há escassez de alimento em casa e uma angustiante busca de compensação alimentar que só quem passou fome conhece.

Com a professora de aniversário todos comemoraram. Foi um dia de felicidade e harmonia na Escola Rural. Presentes chegaram da vila e finalmente aconteceu a reunião de Pais e Mestres com gente sofrida e trabalhadora. Gente da lavoura que sobrevive com muito trabalho e poucos recursos. As crianças se divertiam em volta da mestra, conhecedora de jogos e brinquedos para recreação. Professora vivendo de esforço mal avaliado. Os pequenos querem correrias e expansões. Pular corda, jogar bola, brincar de pega-pega com vareta e caçador. Mas nesse dia chovia até pelos cantos do salão.

Há tanta dificuldade numa escola. Uma escola precisa dar tudo e quase nada tem. Assim protagonizamos o desastre, portanto a improvisação é um instinto. Em meio à algazarra de bolo e balões uma aluna do primário se aproximou da professora aniversariante com alegria nos olhos, tão viva, tão inocente... Julgou a professora que fosse ternura. A menina estava ansiosa e queria lhe narrar um acontecimento inédito. Uma felicidade nascida do desconhecimento como se aquilo não fosse devastador. Disse com alegria:

- Estou diabética.

Dando-lhe grande abraço como se a notícia embalasse um presente aos seus primeiros anos de vida.

Talvez faça alguém rir. Revelo que a comoção em mim é mais forte que o riso. Gastei horas pensando em contribuir. Como melhorar uma escola? Como crescer de vez... Não sei. Só sei dizer que uma escola devia ser uma cidade e possuir tudo.