O dilema: ânus ou anos?
Pois é, não consigo mais perguntar "quantos anos você tem?", porque, de antemão, sempre o saberei (é um só) a não ser que esteja lidando com um deficiente, um PNE ou algum ser intergaláctico.
Claro, a brincadeira, que explora o duplo sentido, acontece porque a pronúncia em português é, foneticamente, igual: "ânus" e "anos" e, talvez por uma teimosa adolescência tardia ou um senso de humor meio deturpado, sempre penso no segundo sentido: quantos ânus você tem?
As brincadeiras e associações já existem. Com o polegar e o indicador de cada mão, fazendo um círculo e simulando um voo com os braços, você pergunta: o que significa isso? Alguém não sabe? Claro que sabe: os anos/ânus passam voando. Você decide.
Tendo internalizado o significado jocoso, até a expressão "há muitos anos/ânus atrás" também me remete a uma piada de mau gosto. E o pior, é recorrente. E "ânus à frente?" Existe? Presta-se à mesma brincadeira? A pronúncia continua a mesma, muda apenas a semântica, de acordo ao humor dos interlocutores. E pior é a emenda do que o soneto, porque se você vai explicar que uma palavra é com "o" e a outra é com "u", está aberta a guarda para mais algumas piadinhas, daqueles que não as perdem, preferem perder os amigos.
Felizes são pessoas de outros idiomas latinos que não precisam ter essa "delicadeza" e podem fazer essa pergunta tão comum e necessária sem medo. Em espanhol as interrogações "cuantos ãnos tienes?" e em italiano "quanti anni hai?", pelo que sei, não remetem ao duplo sentido quando pronunciadas. Difícil fazer piadinha. No francês, a distância ainda é maior, portanto os engraçadinhos, nesse contexto, não têm vez.
Enquanto isso, continuo evitando fazer a tradicional pergunta, principalmente se é dirigida a uma moçoila, donzela ou a uma senhora. Vai que têm a mesma percepção deturpada, posso cair na rede do bullying, do assédio, essas modernidades e aí...
Aos homens, nem tanto. Acabam dando uma resposta qualquer, às vezes, emendando ou remendando a piada, nem sempre original. Prefiro padronizar, portanto, a pergunta: "qual a sua idade" ou, ainda mais, arriscar-me e ter o trabalho de fazer um cálculo, perguntando "em que ano você nasceu". Que também se presta a uma piadinha sem graça, basta forçar a barra e acrescentar um "s" indevido à palavra "ano" e continuar a brincadeira. Mas aí já é forçar a barra mesmo, não dá muito Ibope.