AUSÊNCIA - DEPOIMENTO
"Ausência eu sinto na voz".
Desde quando eu nasci. Logo depois, em poucos anos, meus pais descobriram que eu não falo.
Meus olhos veem analisam; as coisas, as cores, o belo e o feio.
Meus ouvidos ouvem, distinguem os sons e formalizam vozes distintas.
Minha voz, somente eu ouço em gritos e lamentações de sussurros abafados. Em meu cérebro, estão armazenadas várias perguntas sem respostas. Porque ninguém sabe o que se passa dentro de mim. Minha voz é transformada em mímica para aqueles que percebem. E para outros que não entendem é para mim um sofrer.
Minha infância foi tumultuosa: Tudo começou dentro de casa, vendo meu irmão falar e ser atendido. Eu quando brincava com ele, murmurava e apontava para o que eu queria. Com essa atitude foi chamando a atenção em meus pais para a minha dificuldade. Quantas vezes ouvi a palavra mamãe ser dita por meu irmão e repetidas vezes
pronunciadas por minha mãe a querer me ensinar, ou mesmo meu pai.
Era para mim um suplício, eu queria repetir a mesma palavra e não saía a voz. Via os olhos de meus pais marejarem de lágrimas. Só meu gesto de abraços e beijos conformava-os.
O tempo foi passando, no período escolar a convivência com outras crianças normais foram difíceis e necessário. Porém, foi nesta época que eu tive o interesse maior em aprender o que não sabia no meu lar. Criei necessidades de adaptações ao mundo externo. Até mesmo os professores tem dificuldades de ensinar aos deficientes qualquer, não estão preparados. Tive aulas em programas de recuperação fonológica e a foniatria está melhorando o meu viver. Não acredito em falar corretamente, mas tenho certeza em comunicar plenamente. Meu caso é congênito.
Fui criada no meio de familiares católicos na qual tenho fé e dúvidas. Ainda pergunto a Deus se eu mereço esse castigo? Tenho o silêncio como resposta e milhares de outros casos conformados.
Segui a trajetória da vida, com esse pensar e novos aprendizados foram aplicados no dia a dia. Sou jovem, e dizem que sou bonita, tenho os mesmos pensamentos de outras garotas. Faço dos sonhos fantasias e fuga para não pensar na realidade. Todos eu compreendo e nem todos sabem compreender-me. Que ironia... Essa ausência tenho que conviver eternamente. Vivo sem muita alegria, vivo sabendo ignorar o que passa com a minha limitação. Mas tem pessoas preconceituosas que fazem discriminação ofensivas e veladas, não respeitam o ser humano. Esses vivem no vazio. Sou consciente com o que eu quero. Quero levar uma vida normal, ser tratada com dignidade e igualdade de direito. Não peço muito, somente ter oportunidade para viver."
Este depoimento acima é uma narrativa sincera e emocionante de uma jovem que não quis identificar-se. Afinal, para que saber o nome. A dor não tem nome, se expressa em várias maneiras e em várias pessoas. Só aqueles que realmente sentem sabe a razão. É um clamor de tudo que o ser humano não quer. Ao mesmo tempo, neste caso, acena para servir de parâmetro para os professores e profissionais da área médica.
NOTA DO AUTOR: Temos que dar mais amor sem demonstrar piedade para o doente não sentir humilhado. Amor não é Caridade, é sentimento nobre acompanhado de todos os anseios de bondade do ser humano.
Ausência é a sensação no vazio. É a falta da perda no presente.
Batacoto