AMOR – SINGULAR?

Michelle diz:

Estou tão bem.

Blogueiro diz:

Não posso dizer o mesmo. Acabei de ficar mal. Comecei a ler algumas coisas... Não se trata de inveja, longe de mim. Quero mais é que sejam felizes, que quase tudo ali seja verdade. Do que estou falando? De testimonials, de depoimentos desse site de relacionamentos chamado Orkut. Espero que os dois pombinhos fiquem juntos para sempre, com muita sinceridade no coração, mas em certo ponto espero que eles estejam errados. Um amigo meu não está mais na cidade. Seu longo namoro, no entanto, não exibe motivos para ser abruptamente terminado. A relação será conservada à distância. Reitero: tomara que sobreviva! Estava varando (poderia dizer folheando, mas o Orkut ainda não existe na versão papel, e eu tampouco quero esgotar o cartucho de minha impressora dando vazão para aquele fundo azul) por três telas cheias dos depoimentos mais carinhosos, acompanhando a evolução, retroativamente, de cálidos sentimentos. Pelo jeito, continuarão mesmo fiéis, não só um ao outro, mas a seus ideais. Não se aprisionarão nessa relação. Jamais se arrependerão da escolha que fizeram. Olharão para o dedo da mão e sorrirão ao prestigiar aquele anel de compromisso assegurado e asseverado a cada novo alô e novo scrap. Não obstante, o amor único é uma abstração ou procede?

Não entremos no mérito de “é algo plantado pelas telenovelas e obras ficcionais em geral, pois o ser humano não foi projetado para isso”. Teríamos de rever nossos conceitos de democracia e tantos mais, imediatamente; e não pretendo uma discussão tão ampla. Se é plantado pela mídia ou não, procede que uma pessoa passe a vida toda esperando alguém, e se ela vier toda a paciência e cuidado do mundo ainda serão poucos para a eventualidade do jarro se quebrar?

O amor único, o amor-maior, o grande amor da minha vida, é uma coisa que eu não posso perder, caso contrário ficarei sem chão, incomodado até o dia de minha morte? Tirando do âmbito pessoal, visto que é um problema da Humanidade: o amor único da vida de alguém é algo que não se pode perder, pois do contrário ficar-se-á sem piso ou apoio permanentemente, irrevogavelmente?

Será que eu – voltando à análise pessoal para que dissequemos a questão e, então, cada um compare com seu caso, ou o dos outros (estamos aqui para os outros, também!) – nunca vi, e se visse não deixaria escapar? Outra coisa que se insere na questão: há livre-arbítrio? Se há esse amor, ele se realizará? Afinal, se é a minha amada para toda uma vida, eu também sou o amado para a vida dela, e seria severa injúria que dois corações abandonassem o mundo partidos! Ou seja: mais que o medo de perder o amor da vida quando se o encontra, será possível que não há fuga dele, que se é o grande amor ele sempre se concretiza? Empiricamente, jamais saberemos. Outros podem reescrever o dicionário (na verdade criando esse “verbete composto”) com a definição “GRANDE AMOR é... o amor que dá certo”.

E se não for exatamente desse jeito? Quem perde não terá mais a mesma vivacidade, nunca?! E por que motivo alguém teria dois amores e outro nenhum? E se eu já vivi o meu único amor, era aquele, e no momento estou na minha própria pós-História, porquanto ele virou farelo e eu não passo de uma simples capa?

Parece que quanto mais esforço faço para me abrir, engolir meu orgulho e minhas preferências pessoais a fim de conhecer novas e interessantes pessoas, mais o casulo reage se fechando, me protegendo, mas também evitando que eu conheça o perigo mais saudável: o amor!

* * *

Poucos minutos depois, na transposição da conversa de MSN para o formato “artigo in Blog”, capitulo parcialmente de minha posição: é verdade que o ferimento não cicatriza, mas não se pode subestimar a capacidade do ser humano de sobreviver, em quais circunstâncias forem. Além disso, não me considerem uma pessoa melancólica. Eu só fico assim muito de vez em quando, quando paro para pensar. E no Fim da História fica cada vez mais raro achar essa brecha reflexiva. De fato, é o limbo entre “viver intensa e brevemente” e “preencher dias e dias de calendários e calendários - talvez sem significado”. Em uma coisa, você, leitor, vai concordar: amar é tão desgastante para o nosso coração que encurta nossa vida. Enxergar tal encurtamento como vantagem ou prejuízo depende de quem ama.

(Domingo, 28 de Janeiro de 2007)