Primeira Viagem de Avião
O piloto. Alto, louro, conversador, legal, boa pinta. O campo. A pista de asfalto, fininha e escurecida, da cor de nimbos. O vento. A velocidade do aviãozinho teco-teco. O chão. Agora, não há mais o chão. Pelo menos para nós, não há mais o chão.
Quarenta, oitenta, cem metros, trezentos, quinhentos. Velocidade sessenta milhas, acho que era. Dava, na horizontal, cento e cinquenta por hora. Quilômetros. Cento e cinquenta por hora.
Muita mata. Muito verde. Parecia uma gravura da revista Manchete. Muito alto, tudo pequeno, os carros correndo, os homens andando.
O aviãozinho. O PP-HHZ. Levezinho e espertinho, de asas grandonas como orelhas de elefante.
Dumbo. O elefante Dumbo passa por cima do Mineirão. Os rapazes estão fazendo preliminar do vestibular da Federal. Dumbo se abaixa pra que eu veja mais de perto.
Depois a cidade. Tão bacana a cidade, as letras grandes do telhado da Eureka. A igreja São José e o aviãozinho da Segunda Guerra, fazendo propaganda do Aero Clube.
O piloto pergunta:
- Cê guenta? Pode fazer uma acrobacia?
- Cê que sabe se pode, uai!
Uma rodopiada para a direita. Uma descida de cinco a dez metros. Uma volta completa sobre si. Uma volta para cima.
Foi como se duzentas pessoas pisassem sobre minha cabeça ao mesmo tempo. Depois, saí com dor danada. Acho que não tive muito medo para a primeira vez. O piloto louro, inclusive, deu-me os comandos um instantezinho, pra que virasse Dumbo para um lado e outro. Não fiz direito. Lógico que não. Também pudera.
Depois a volta. Sobrevoar o campo, atravessá-lo, dar volta de cento e oitenta graus, de duas vezes. Logo, a descidinha fácil e mais outra coisa pra eu ficar contando e me deixar alegre por uns dois dias.
Agora, penso em ser piloto.
(Aeroporto Carlos Prates, Belo Horizonte, MG, sábado, 28/11/1972)