Zeferininha!
Texto de isabel SprengerRibas.
Março, 2016, Ctba, Pr
 
Esta história é verídica. Ao menos assim me foi contada.
Era ele um guri loiro, belo, comprido, alegre. Estava incluído entre os doze descendentes do casal Lisboa Sprenger, filhos de Odila Lisboa Sprenger e Leopoldo Sprenger, meus avós paternos.
O pai, filho de emigrantes que aportaram nesta terra brasileira originários de Viena, ainda quando de posse alemã. Ela, igualmente filha de gente vinda de fora. Portugal.
 
Esses dois seres tão diferentes em suas origens, se encontraram, se desejaram, se amaram, construíram juntos as suas vidas. Fizeram filhos, foram felizes, comerciantes, eficazes e atuantes pessoas na terra de Guarapuava, Município do Paraná. Deixaram timbre forte.
 
Não deles é que desejo falar nesta rememoração de fatos...tão adoráveis fatos da minha vida...
 
Sim, quero dizer de um de seus filhos, meu pai, a quem acima me referi como o guri loiro...ele que me contava esta história.

Sempre...Sempre em que enxugava as louças para mim. Neste instante eu o vejo aqui, muito próximo de onde escrevo...
 
Ainda que houvesse em minha casa mais quatro seres amados de outro gênero que não o meu, logo após o almoço, quem me acompanhava na romaria vai e volta da sala à cozinha, com pratos travessas, copos, era ele, o meu adorado alemão a quem, designou Deus, fosse o meu pai. Depois, à lavação das louças e panelas...
 
Hora boa de um papo que ainda agora estaria existindo se não estivesse ele em outro patamar. Um papo que ficou, ficaria, sempre, pela metade...
 
Brigávamos muito, sim. Divergindo em política, em modo de vida, em modo de viver, em maneira de ser. De nada adiantava tal divergência. A gente se achava de novo e rapidamente pelo olhar, mesmo em silencio, logo que uma situação qualquer demandasse. Era deste modo. Simples assim.
 
Ele me contava, falando. “Ela era uma pessoinha muito engraçada. Sabe, deveria ter uns quase 100 anos nesta época”.
E me dizia tudo sobre a sua tia, quem ele nem sabia realmente como era sua tia.
 
Muito velhinha, magra e pequenina, se alimentava apenas de cafezinho forte, vez por outra, de arroz e feijão preto, muito, muito pouco. E fumava seu cigarro de palha intermitentemente, a qualquer hora e em todas as situações.
 
Nas vezes em que o pai amado, meninão de uns 14, 15 anos, a ajudava em suas tarefas cotidianas - preocupava-se com toda a sua gente, com seus afazeres, como os dela,  em tão tardia idade- e era sempre enxugando enquanto ela lavava a louça.
 
Velhinha, mal via o que fazia, ainda que, certamente, se esforçasse. Ia ela passando a louça. Ele, o gurizão ali, atento. Pegando, prato a prato.
 
Certo instante, olho astuto e jovem, percebe...com muito tato e cheio de pruridos para não ferí-la, diz:
 
Tia, tia Zeferininha, aqui ficou um pouco sem lavar...acho que não viu, tia... ouviu, tia?
Respondia ela: Nada, fiô, isto não tem importância...Tira no pano, fiô...Sai, fiô, sai tudinho no pano...
 
A história era sempre a mesma na hora domingueira da minha, da nossa lavação das louças.
E as risadas que ríamos, também, sempre iguais...a Zeferininha da vida dele, que  se tornava tão presente na minha. Tornou-se!
 
Dizia meu pai, ainda, que essa velhinha tão amante da vida deixou seu próprio epitáfio redigido. Está ela enterrada no Cemitério de Guarapuava, onde descansa grande parte da minha gente já perdida, minhas tias, tios amados, primos de minha juventude, gente do meu amor.
 
Segunda consta, ela era voltada também à escrita.
Assim se lê:
“Aqui jaz irmã Zefirininha. Que foi. Mas foi muito contrariada”...
 
Eu detesto plágios como qualquer pessoa decente...
Mas se não ficasse tão invasivo perante minha família, aos menos entre os que ainda restam por aqui, eu pediria que lá, lá, sabem, lá, quando da minha ida, escrevessem mais ou menos o mesmo.
 
Mudando apenas o nome.
Poderia ser no diminuitivo... Se fosse Belzinha, seria, como a dela, uma designação ainda mais carinhosa...Daria, é claro, para dar uma pequena modificada...Seria oportuno deste modo:
 
Foi. Mas foi MUIiiiiiiiiiTO contrariada.
Ela, tão vivida...
Foi-se a Belzinha, ENFIM, desta vida!
isabel Sprenger Ribas
Enviado por isabel Sprenger Ribas em 14/03/2017
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