Pé ante Pé

Tenho o agora: frágil, insone e triste, é tudo que tenho. Revolto-me, cansada, com a incerteza dos próximos instantes, que podem ser frágeis, insones, tristes. Em silêncio, peço a Deus que os abençoe, desconhecidos, amedrontam-me. Peço que me dê forças para superar a dor dos instantes que, hoje, são apenas uma singela lembrança de algo que já foi agora. Pois é tudo que tenho: uma mistura doce de arrependimento e esperança, um leve caminhar nas linhas bambas da vida. Pé ante pé, como quando perambulo acordada pela casa. Pé ante pé. Pé ante pé.

Respiro fundo. Pé ante pé. Estou só. Pé ante pé. É tudo que tenho, não o instante, o instante é falho, desmanchou-se antes mesmo de existir, tenho a esperança. A esperança de que a vida há de valer a pena, de que há um caminho, outros instantes, outras pessoas e outras noites. De que há o sono e a paz e a poesia e as palavras. De que há algo, que ainda não sei o nome, por aí. Algo que fará sentindo e será sentindo, algo que espero logo saber o que é.

Pé ante pé. Desço, tomo café, subo as escadas e encontro-me novamente em frente à cama que me renegou por toda a noite. Dou a ela meu perdão, e, sem que perceba, dou a mim o meu perdão. Perdoo-me por tudo. Por tudo que me deixa acordada, por tudo que foi falho, pelos amores inacabados. Fecho a janela para que o mundo não entre e faço da manhã, barulhenta, meu instante de paz. Desligo os celulares, cancelo os compromissos e, pé ante pé, conquisto a paz que, injustamente, roubaram de mim.