Momento de Azul
O burburinho, os sons vindos de outros bares misturam-se à música moderna do bar. Algumas bochechas avermelhadas, olhares lascivos, cheios de suplicas dissipam-se nos ares etílicos da atmosfera. Enquanto eu, sentado, com meus trajes sociais – vestido como um crente no meio de shortinhos jeans que deixavam mais da metade de nádegas de fora – com as minhas pernas cruzadas, fito a beleza da lagoa azul, através da transparência embaçada do copo de vidro umedecido, levemente resfriado pelas pedras de gelo. Aqui não é o meu lugar, não mais, outrora sim, mas agora não.
Fito o conviva ao meu lado e ele saúda-me com os olhos melancólicos. Observo-o cuidadosamente e percebo dois dedos de uma das mãos amputados.
– Como perdeu os dedos? – Indago passando o copo de lagoa azul para ele.
Ele sorve um pouco do liquido azulado, seca os lábios com a costa da mão e murmura:
– Só conto se você me disser como arrumou essa cicatriz que vai do supercílio até abaixo de seu olho.
Algumas coisas não precisam ser confessadas ou comentadas, o tempo sepulta e cicatrizes são apenas epitáfios, sim, epitáfios ilegíveis de uma língua morta.