É PRECISO O ESPANTO, É PRECISO A PERPLEXIDADE

Estamos mesmo nos acostumando com os horrores que estão arruinando nossa sociedade. As atrocidades praticadas contra o outro ou contra o meio ambiente, bem como as catástrofes naturais e os problemas de saúde pública, ganharam cunho de normalidade. Nada neste século causa o espanto, tudo é normal, principalmente se não formos atingidos diretamente. Em uma entrevista, o grande Poeta Ferreira Gullar disse que a inspiração para sua escrita era o ESPANTO diante das coisas erradas e cruéis praticadas contra a sociedade. Completou o seu raciocínio dizendo que se não houve o ESPANTO, não teria existido o poeta Ferreira Gullar.

O grande problema é que as pessoas da nossa era não conseguem perceber o mundo em que habitam, não captam os sinais efervescentes que os cercam, não têm a capacidade de descortinar o universo ao qual estão envolvidas, por mais próximo que seja. Nossa visão foi reduzida a poucos metros a nossa frente. Perdemos, de fato, a capacidade de captar o mundo em 360º. A máxima é: eu me basto. O problema do outro se torna invisível para mim.

Em seu excelente poema, Madrigal lúgubre, Carlos Drummond de Andrade sinaliza a necessidade de nos atentarmos para os problemas que afligem a sociedade. Nesse texto, enquanto a princesa dorme, Drummond tentar alertá-la sobre as crueldades praticadas contra o povo, mas a princesa segue em seu sono tranquilo, alheia aos problemas. Como a princesa do poema, a sociedade também continua em seu sono profundo, indiferente a todo tipo de adversidade que, como um câncer, está provocando, silenciosamente, a invisibilidade dos mais cruéis e terríveis problemas que afetam a todos, principalmente aos mais carentes.

É necessário descortinarmos nossa mente para melhor percebermos os dilemas do dia a dia. Para uma vida plena, necessitamos do ESPANTO, do aborrecimento, do choque. Não agimos enquanto os fatos não nos incomodam e nada nos incomoda se nada percebermos. Para resolvermos uma problemática, primeiramente temos que identificá-la. É preciso enxergarmos o mendigo, é preciso percebermos o andarilho, é necessário o espanto diante do incêndios que destroem a natureza, é preciso questionar diante de tanta violência, é necessário tentar entender as pessoas que jogam lixo fora do seu devido lugar, é preciso evitar tantas morte por acidentes, é preciso evitar o racismo e o preconceito, é preciso combater a corrupção, é preciso ..., é preciso..., é preciso o ESPANTO E PERPLEXIDADE