Envelhecer é o outono da vida - 14/12/2013
Enquanto me deixo ficar preguiçosamente acomodada em um banco da praça, lembro-me daquela figura branda do senhor sentado à minha frente, à certa distância, apoiado tranquilamente em uma bengala de cabo prateado. Pensativo, observava o seu redor, com olhos de sabedoria, um leve sorriso nos lábios, apreciando ou pensando, sabe Deus o que! Quanto tempo se passara desde aquele encontro?
Naquele dia, eu pensava: quem seria ele? Não podia deixar de imaginar sua história. E se eu lhe perguntasse? Será que se aborreceria? Olhava para ele e para a secular árvore sob a qual ele se encontrava. De repente, uma folha pousou em seu colo. Tomou-a nas mãos e a segurou, sem menção de atirá-la fora. Cheirou-a prazerosamente e olhou sorridente para cima, como se agradecesse pela folha que estava em suas mãos.
Aproximei-me, devagar, como quem nada quer, sentando-me ao seu lado. Sorriu-me e eu devolvi o sorriso. Perguntei-lhe porque guardara a folha que caíra junto a ele. Olhou-me com aqueles olhos claros, sempre sorrindo e me disse:
−Sabe, minha jovem? O outono é a estação em que as folhas, sem vida, se espalham pelo chão, por não mais conseguirem extrair, da árvore que lhes deu o viço da juventude, durante a primavera, a seiva que as alimentavam. − olhando para a folha em suas mãos, continuou: −Espalham-se pelo chão, um tanto ressecadas, sendo apenas uma leve sombra do que foram outrora. Perderam suas cores, brilho, embora ainda conservem suas formas. Veja esta! Sinta o seu aroma!
−Cravo? − perguntei.
_Percebeu? Quando são perfumadas por natureza, mesmo ressecadas mantêm o seu aroma. Às vezes, são pisoteadas pelos que passam, indiferentes à nostalgia que envolve este envelhecer. Porém, são folhas que, mesmo colhidas do chão, são responsáveis pelos lindos arranjos que embelezam ou perfumam locais. Portanto, não são folhas mortas!
−Dizem, − continuou falando − que envelhecer é o outono da vida. Mas, eu lhe digo que, envelhecer, é mais do que entrar no outono da vida. É reviver intensamente cada momento vivenciado, é expor toda a experiência de uma existência rica de conhecimentos e de momentos, ora belos e saudosos, ora tristes, mas não desprezados ou esquecidos, pois foram aqueles momentos difíceis, que muitas vezes produziram lágrimas doloridas, o alicerce sobre o qual a vida constrói a sua história.
Fez uma pequena pausa e continuou:
−O outono traz saudades; a velhice também! O outono é nostálgico, mas a velhice, nem sempre, porque as saudades são lembranças daquilo que se viveu. Permanecem na memória como pequenas histórias, partes de quem as sente. − continuou falando como se estivesse monologando.
−Envelhecer é alcançar uma realidade que transcende o pensamento jovem. É poder contar, cada ano vivido, como um período de tempo pleno de conquistas e de saberes que formam uma bagagem que ninguém pode nos tirar. O outono talvez seja triste, mas é belo. Conta, em cada folha desprendida e jogada ao chão, um fato, uma emoção, seja ela marcada pela alegria, tristeza, lágrima, risos...
−Entretanto, é preciso pensar que, cada riso é maior do que uma tristeza, porque o riso é colorido, ressoa, espalha vida e energia, tem sonoridade. Cada riso é a nota musical de uma música diferente. A tristeza, pelo contrário, é sombriamente acinzentada, uma cor que se perde na noite dos tempos. Mesmo que fiquem algumas cicatrizes, nossa experiência ajuda a minimizar. Se pensarmos bem, perceberemos que rimos mais do que choramos!
Eu nada dizia. Apenas queria ficar ouvindo a sua voz mansa, dizendo coisas simples com sabedoria. Ele parecia entender minha expectativa.
−Assim, o envelhecer nos traz de volta a juventude, porque temos o poder de ressuscitar o passado, de reviver cada momento que escolhemos relembrar. Temos o poder de jogar, para fora de nós, aquilo que não mais desejamos em nossas memórias, desfazer o que nos incomoda e tecer cada momento presente com as cores e o perfume de que mais gostamos. Tudo isto é possível, pois, nossa experiência nos concedeu este poder de decidir.
−Envelhecer é entrar no outono da vida sem tristezas; é deixar em cada folha caída de nossa existência, um momento gravado contando nossa história. Porém, não somos simples sombras do que fomos, deixando que a noite dos tempos apague nosso viço de outrora. Somos como esta folha: envelhecemos, mas conservamos a nossa essência.
−Envelhecer é deixar em cada fio de cabelo branco, o testemunho de uma experiência. Por isto, quando esta folha caiu, pensei que poderia ser um fio dos cabelos desta árvore que já existia aqui, antes de eu nascer. Imagine o quanto ela é idosa! Imagine quantas histórias tem para relatar! − sorriu e me perguntou: −Consegue entender o que digo?
Olhei-o nos olhos e vi que não estava ironizando. Então, respondi:
−Obrigado por me fazer sentir a essência desta folha em suas mãos! Obrigado por me permitir penetrar na sua saudade, nas suas lembranças e, acima de tudo, em sua serenidade.
Abaixei-me e peguei uma folha do cravo. Levantei-me e dele me despedi. Sorriu-me, dizendo: −Adeus, minha jovem! Nunca se esqueça de conservar a sua essência e envelhecer feliz!
Sorri de minhas lembranças. Então, peguei uma folha de cravo caída ao meu lado e, apoiando-me na bengala de cabo prateado, levantei-me, sorrindo, e segui meu caminho.
Najet, editado em Março de 2017
Enquanto me deixo ficar preguiçosamente acomodada em um banco da praça, lembro-me daquela figura branda do senhor sentado à minha frente, à certa distância, apoiado tranquilamente em uma bengala de cabo prateado. Pensativo, observava o seu redor, com olhos de sabedoria, um leve sorriso nos lábios, apreciando ou pensando, sabe Deus o que! Quanto tempo se passara desde aquele encontro?
Naquele dia, eu pensava: quem seria ele? Não podia deixar de imaginar sua história. E se eu lhe perguntasse? Será que se aborreceria? Olhava para ele e para a secular árvore sob a qual ele se encontrava. De repente, uma folha pousou em seu colo. Tomou-a nas mãos e a segurou, sem menção de atirá-la fora. Cheirou-a prazerosamente e olhou sorridente para cima, como se agradecesse pela folha que estava em suas mãos.
Aproximei-me, devagar, como quem nada quer, sentando-me ao seu lado. Sorriu-me e eu devolvi o sorriso. Perguntei-lhe porque guardara a folha que caíra junto a ele. Olhou-me com aqueles olhos claros, sempre sorrindo e me disse:
−Sabe, minha jovem? O outono é a estação em que as folhas, sem vida, se espalham pelo chão, por não mais conseguirem extrair, da árvore que lhes deu o viço da juventude, durante a primavera, a seiva que as alimentavam. − olhando para a folha em suas mãos, continuou: −Espalham-se pelo chão, um tanto ressecadas, sendo apenas uma leve sombra do que foram outrora. Perderam suas cores, brilho, embora ainda conservem suas formas. Veja esta! Sinta o seu aroma!
−Cravo? − perguntei.
_Percebeu? Quando são perfumadas por natureza, mesmo ressecadas mantêm o seu aroma. Às vezes, são pisoteadas pelos que passam, indiferentes à nostalgia que envolve este envelhecer. Porém, são folhas que, mesmo colhidas do chão, são responsáveis pelos lindos arranjos que embelezam ou perfumam locais. Portanto, não são folhas mortas!
−Dizem, − continuou falando − que envelhecer é o outono da vida. Mas, eu lhe digo que, envelhecer, é mais do que entrar no outono da vida. É reviver intensamente cada momento vivenciado, é expor toda a experiência de uma existência rica de conhecimentos e de momentos, ora belos e saudosos, ora tristes, mas não desprezados ou esquecidos, pois foram aqueles momentos difíceis, que muitas vezes produziram lágrimas doloridas, o alicerce sobre o qual a vida constrói a sua história.
Fez uma pequena pausa e continuou:
−O outono traz saudades; a velhice também! O outono é nostálgico, mas a velhice, nem sempre, porque as saudades são lembranças daquilo que se viveu. Permanecem na memória como pequenas histórias, partes de quem as sente. − continuou falando como se estivesse monologando.
−Envelhecer é alcançar uma realidade que transcende o pensamento jovem. É poder contar, cada ano vivido, como um período de tempo pleno de conquistas e de saberes que formam uma bagagem que ninguém pode nos tirar. O outono talvez seja triste, mas é belo. Conta, em cada folha desprendida e jogada ao chão, um fato, uma emoção, seja ela marcada pela alegria, tristeza, lágrima, risos...
−Entretanto, é preciso pensar que, cada riso é maior do que uma tristeza, porque o riso é colorido, ressoa, espalha vida e energia, tem sonoridade. Cada riso é a nota musical de uma música diferente. A tristeza, pelo contrário, é sombriamente acinzentada, uma cor que se perde na noite dos tempos. Mesmo que fiquem algumas cicatrizes, nossa experiência ajuda a minimizar. Se pensarmos bem, perceberemos que rimos mais do que choramos!
Eu nada dizia. Apenas queria ficar ouvindo a sua voz mansa, dizendo coisas simples com sabedoria. Ele parecia entender minha expectativa.
−Assim, o envelhecer nos traz de volta a juventude, porque temos o poder de ressuscitar o passado, de reviver cada momento que escolhemos relembrar. Temos o poder de jogar, para fora de nós, aquilo que não mais desejamos em nossas memórias, desfazer o que nos incomoda e tecer cada momento presente com as cores e o perfume de que mais gostamos. Tudo isto é possível, pois, nossa experiência nos concedeu este poder de decidir.
−Envelhecer é entrar no outono da vida sem tristezas; é deixar em cada folha caída de nossa existência, um momento gravado contando nossa história. Porém, não somos simples sombras do que fomos, deixando que a noite dos tempos apague nosso viço de outrora. Somos como esta folha: envelhecemos, mas conservamos a nossa essência.
−Envelhecer é deixar em cada fio de cabelo branco, o testemunho de uma experiência. Por isto, quando esta folha caiu, pensei que poderia ser um fio dos cabelos desta árvore que já existia aqui, antes de eu nascer. Imagine o quanto ela é idosa! Imagine quantas histórias tem para relatar! − sorriu e me perguntou: −Consegue entender o que digo?
Olhei-o nos olhos e vi que não estava ironizando. Então, respondi:
−Obrigado por me fazer sentir a essência desta folha em suas mãos! Obrigado por me permitir penetrar na sua saudade, nas suas lembranças e, acima de tudo, em sua serenidade.
Abaixei-me e peguei uma folha do cravo. Levantei-me e dele me despedi. Sorriu-me, dizendo: −Adeus, minha jovem! Nunca se esqueça de conservar a sua essência e envelhecer feliz!
Sorri de minhas lembranças. Então, peguei uma folha de cravo caída ao meu lado e, apoiando-me na bengala de cabo prateado, levantei-me, sorrindo, e segui meu caminho.
Najet, editado em Março de 2017