Dualidade

Cissa de Oliveira

Acho que é porque a gente nasce meio. Livro branco, sem letra, ponto, vírgula, nada. Aí o pai vai lá na Lei e diz que no mundo há mais uma boca. E que a nova boca tem que ter um nome, uma certidão. Que ela vai se chamar Maria, ou então José ou João.

José A. M. foi o que coube na certidão do meu irmão. Mas na vizinhança onde morávamos quando ele tinha os seus dez, onze anos, era chamado por nada mais nada menos do que “Coxinha”. Tadinho, tudo só porque tinha as pernas bonitas! Acreditem, meninos também têm amigos invejosos. Minha mãe, a senhora sem papas na língua e de sobrenome Araújo, resolveu acabar com o constrangimento do Coxx... digo José, quando instituiu: é pra chamar de José Araújo! Ai do moleque que ela atendesse no portão chamando pelo Coxiii... bem, logo eles mudavam para José Araújo. - Ele está? Dentro de casa, risada geral. Tanto ela fez que foi aí que o apelido pegou mesmo.

Seja como for, nome parece sempre uma questão que gera descontentamento no dono. Raramente alguém diz que gosta do próprio. Eu mesma já escrevi que virei Cissa por não gostar do meu nome de batismo, e depois Cissa de Oliveira, esse sim, me parecendo então, um nome para poeta.

E seres escritores, poetas, jornalistas e etc, querem mais que ser completos, como se para enxergar o “todo”, dualidades devessem andar de mãos dadas. Dualidade, maçaroca ou metade, de qualquer jeito é o todo, só que passando pela questão do olhar. Vai ver que é porque o bom, mesmo, não é o número três, o quatro, o cinco, o seis. É o dois. Esse, você só dobra ou abre uma vez. Pronto. É questão de praticidade. Você olha pro lado e a dualidade se faz, como num espelho.

Pensando bem, mamãe bem pode ter se estressado à toa... coxinha no plural é uma senhora dualidade!

- O que é?

... o Sr. Coxx... José Araújo não acha.

Cissa de Oliveira
Enviado por Cissa de Oliveira em 04/08/2007
Reeditado em 28/10/2007
Código do texto: T593048