UM PAÍS (crônica de uma prefeitura)
Até pode ser que um dia sejamos um país correto e digno em sua totalidade, não sou tão pessimista a ponto de descartar esta ideia. Entretanto, a menor noção de cálculo matemático me direciona para uma conclusão, a de que, quem sabe, com muito boa vontade, isto ocorra para bisnetos dos meus bisnetos. Estive recentemente em um município sergipano e, passando pela pracinha e pela calçada da prefeitura, vi que uma leva de pessoas, todas com aquele inconfundível ar de gente desprovida de dinheiro e outros itens se acumulava, tanto na praça, quanto nas calçadas, quanto dentro dos corredores da prefeitura (entrei para me conformar com aquilo). Conversando com algumas dessas pessoas tive a confirmação de que ali estavam para pedir emprego ao prefeito. Outros indivíduos estavam ali para pedir gás de cozinha ou qualquer outro item em falta, como sempre, em suas casas. Andei tentando fazer uma abordagem política, dizendo às pessoas que aquela era uma situação indigna, humilhante, e que elas, as pessoas, não teriam que pedir coisa alguma e que nem o prefeito era dono dos empregos. Digamos que 1% concordou comigo, mas os outros 99% estavam firmes em afirmar coisas como: QUE JEITO? É ASSIM MESMO. QUEM MANDA É ELE (O PREFEITO). Ô, MINHA, FIA, NÓIS NUM TEM OUTRO JEITO, TEM QUE PEDIR. E por aí foi esta coisa horrenda em pleno século XXI. Fiquei pensando no fato de que, saindo do Brasil, nunca vi uma prefeitura lotada de gente destruída e pedindo empregos. Eu não gosto da pergunta Que país é este? Eu sei que o país, ele mesmo, em sua essência, é vítima também. Eu sei que esse tipo de mentalidade foi ensinada, incutida, enraizada. E que agora é um câncer. Eu quero é perguntar onde está a justiça e a tal da Lava Jato. E se a justiça e a Lava Jato quiserem, nem é mesmo preciso que eu diga o nome da cidade onde estive, é só ir em qualquer dos municípios sergipanos. Mas, justiça e Lava Jato, eu estaria disposta a ir com vocês até o município onde isto aconteceu. Dou até a chance de vocês se mostrarem inocentes e surpresos. Dou até a chance de vocês acreditarem que eu acredito numa solução para o país. Aquelas pessoas nem sonham com tanta informação e nem acreditam nela, aquelas pessoas querem o gás de cozinha, querem um subemprego varrendo as ruas. De repente, enquanto eu conversava com uma senhora que tem oito pessoas em casa, das quais sete são desempregadas e só uma filha tem um empreguinho com o qual sustenta a família, quando vai passando um carrão dirigido por um senhor bem vestido. Foi aí que a senhora me disse, desinteressando-se da minha conversa: O PREFEITO CHEGOU, OLHE O CARRO DELE. O carro não é dele, disse eu, mesmo desesperançada, nem o carro e nem o emprego, o carro é seu, é nosso. Ela, como dizem os adolescentes, partiu em direção ao mosqueiro de “gente” que esperava aquela autoridade que chegou já no horário de almoço...