Onde está a falha na educação?
Onde está a falha na educação?
Uma crônica de Gabriella Gilmore
Carmela termina seu café da manhã às pressas. Ela tinha de estar pontualmente as 9hrs na biblioteca pública para a roda de leitura com os alunos do 9º ano.
Ufa! Chegou a tempo.
O assunto era sobre Nelson Mandela.
Com um texto de 4 páginas nas mãos, os alunos tentavam acompanhar a leitura dividida entre eles, sugestão feita pelo bibliotecário. Não funcionou.
- Quem quer começar?
Houve um breve silêncio. Depois começou as gargalhadas sussurradas. Um aluno cutucava o outro.
- Leia você! Sugeriu Américo. Ah, não quer? Então, leia você. Pediu com gentileza ao estudante ao lado. E assim foi até encontrar no meio da roda uma primeira pessoa para começar a leitura.
É assustador ver como os adolescentes de hoje são inquietos, desinteressados, infantis, tímidos e tolos. Será que o problema está dentro de casa ou dentro de sala de aula?
Carmela observava aquilo com lágrimas nos olhos.
É triste ver a falta de inspiração pela cultura assistido pelo comportamento das crianças.
Por que será que eles não gostam de ler? Isso explica sua inquietude dentro de sala?
Nisso veio um filme na cabeça de Carmela. Ela nunca aprendera a gostar de ler dentro de casa e nem dentro de sala. Nunca explicaram a ela o prazer e a alegria que uma leitura poderia proporcionar. Na verdade, ela nunca teve pais ou professores apaixonados pelo saber, pela cultura. O segredo está na paixão!! Uma vez, ela com 19 anos, conheceu pela internet uma adolescente muito sabida que tinha 14 anos, e ali, ela sentiu interesse em participar daquele mundo culto para tentar entender aquela paixão que saia de dentro de Helena, tão nova, tão agradável, tão adulta!
Carmela nunca mais conseguiu sair daquele mundo das letras.
O bochicho paralelo na roda atrapalhava a leitura, Carmela irritada, se levantou e começou a discursar.
- Senhores professores e responsáveis pelo espaço cultural. Bom dia! Peço um minuto para uma palavra.
Eles se entreolharam tentando lembrar donde surgiu aquela jovem senhora. Não a reconheceram.
- Me chamo Carmela Pinhão. Sou estudante de Letras. E estou apaixonada por estes alunos.
Em questão de segundos a roda silenciou-se e olharam para ela.
- Estou aqui admirando a beleza e juventude de todos vocês. E imaginando quantos meninos e meninas brilhantes vamos ter daqui uns anos. Aposto que temos aqui ótimos jogadores de futebol, músicos, dançarinos, poetas, pessoas que gostam de ajudar os outros, e leitores entusiasmados. Aposto que tem!! Mas por que vocês estão tímidos e ansiosos em participar dessa rodinha de leitura? Olha! Eu não sou melhor que vocês. E nem os professores ali sentados naquela enorme mesa quadrada. Somos tão bons quanto vocês. Vamos imaginar um corpo e suas partes. Os pés é parecido com os rins? E os braços com os olhos? São bem diferentes né? Mas eles fazem parte de um corpo, e cada um tem sua especialidade, tem o seu talento. E aqui nessa roda todos nós somos úteis e inteligentes, e é por isso que precisamos nos unir e interagir uns com os outros, para que tudo funcione prazerosamente. Eu ainda estou tentando entender por quê que vocês se olham e ficam rindo. (Carmela começou a rir. Logo a turma também).
- Tá vendo? Deixe a tensão para as pessoas rabugentas. Aposto que aqui não têm rabugentos.
Pessoal, a leitura é mágica. Não sei se já te falaram isso. Mas ela é tão completa, que deixa a gente dependente, você acredita? Com a leitura a gente consegue viajar sem sair de casa. A gente melhora a nossa escrita. A gente consegue conversar com pessoas diferentes e deixar marcas. A gente melhora o nosso conhecimento e a ansiedade diminui. Não acredito que nunca falaram isso para vocês. E digo mais: criar esse hábito de leitura pode começar conosco. Eu sei que temos pais que às vezes não tem tempo para nós, mas começar a fazer uso da leitura é igual a experimentar pratos diferentes. Quem gosta de ir a restaurantes diferentes?
(Todo mundo levantou as mãos).
Pois é exatamente isso que acontece conosco quando a gente inclui o hábito da leitura na nossa agenda.
Não estou dizendo que você vai deixar de jogar vídeo game ou mexer no celular, você só vai incluir mais uma coisa na sua rotina. E para começar, escolha um personagem ou um assunto que você adore. Aposto que quando começar, não vai querer parar mais. Porque vai gerando aqueles links relacionados, assunto com assunto, dai o conhecimento nos mostra como ele é infinito. Hey você! Todo ralado nas pernas!! Chamou Carmela o jovenzinho na roda. Aposto que caiu de bicicleta né?
- Foi sim tia, como sabe?
- Ah, eu chutei ahahaha Você pode começar a ler sobre ciclistas famosos e aqueles que fazem atividades radicais na bicicleta. O que acha? Quem sabe você também não queira ser como algum deles um dia! Ou criar alguma modalidade diferente?
Os alunos se olharam, e Carmela encerrou o discurso.
- Quem quer continuar a leitura? Perguntou uma das professoras responsáveis pelo grupo.
Todos levantaram as mãos.