ÓLEO DE RÍCINO CURA TUDO !
ÓLEO DE RÍCINO CURA TUDO !
É difícil se acreditar que gerações inteiras de crianças e até jovens foram obrigadas a engolir o intragável óleo de rícino, mesmo quando não estavam doentes. Quem já "comeu" ovo cru tem uma pálida idéia do "gôsto" que tinha o terrível remédio que, segundo os pais, servia para tudo, de dor de barriga à lombrigas, curava de ânsia de vômito a intestino preso. Inacreditável é saber que nenhum médico,nenhuma entidade de saúde, autoridade alguma jamais testou a eficácia do"veneno".
Mas o elegante vidro de "Emulsão do Dr. Scott" -- que certamente nunca bebeu aquela "imundície" -- não ficava atrás... com um cheiro horrendo de bacalhau podre, nos fazia arrepender-se de termos nascido. Iodo no machucado (com 70° graus de álcool) era outro suplício... "se dói é porque está curando" argumentava a dupla de"torturadores", travestidos de pais.
A geração nascida nos anos 40 e 50 do século anterior -- já com ânsia de liberdade impregnada no seu DNA -- rebelava-se internamente contra boa parte dos costumes da época, geralmente sacrifícios desnecessários que a criançada não entendia nem aceitava. O almoço em família era feito num silêncio sepulcral, além da oração inicial nem mais um pio, nada de garfo ou colher batendo no prato e muito menos "barulhos" com a boca, se o cardápio continha sopa ou macarrão.
Roupa nova só no Natal, no resto do ano usava-se o "short" do irmão mais velho ou a calça ("sobrando" tecido por todos os lados) do pai. Corte de cabelo era um só, até os 9-10 anos... número 0 na cabeça inteira, exceto um "tufo" na frente da testa, o supra-sumo do mau-gosto, que o jogador "Ronaldo Fenômeno" reeditou numa das Copas. Quem tinha cabelo normal usava Creme Glostora para "gomalinar", as meninas não dispensavam o "laquê" (espécie de cola em spray)para endurecer os cachos e manter o penteado por horas e horas. Cinto era para os vovôs, o bom era um vistoso suspensório colorido, chapéu de feltro ou o famoso "panamá" e gravatinha borboleta para quem usasse calça.
Felizmente os tempos mudaram, o óleo de rícino ficou apenas na lembrança de quem viveu uma época em que se podia andar nas ruas de madrugada sem o receio de assaltos ou coisa pior. Meu parceiro de dupla quase sertaneja ABIEZÉR SILVA recordou em uma bela canção seus tempos de menino nas ruas e ladeiras de Olinda e a presença dos mascates -- vendedores ambulantes hoje conhecidos como "camelôs -- na vida da cidade. "Pregões do Recife" é um belo hino à existência desses batalhadores e torço para que Silva tenha deixado gravada sua música nas 2 "únicas" fitas cassette que estão por aí, uma delas entregue à folclorista Nazaré Pereira (por volta de 1995/96, em Icoaraci) e outra ao amigo sambista Cléber Nascimento, vulgo mestre"André", em 1992, ano do show "Ação Entre Amigos" que fizemos no teatro do CENTUR, gravado pelo técnico de som "Dako". Como quase nada lembro da letra original, cometo o sacrilégio de "recriá-la", mantendo objetos, produtos e alimentos que seriam daqueles "belos tempos que não voltam mais", como cantou êle de forma magistral.
PREGÕES DO RECIFE
I
Tenho vassoura, espanador, colher de pau,
cravo, canela em pó, rapa-côco e grelha.
Tenho "quartinha" pra vender... SORVETE !,
olha o miúdo para o cão,
doce de "abóbra", côco e abará,
pra sua satisfação.
I I
Tenho essência de maracujá,
escova e pente eu tenho pra vender...
ervas e pós, pomadas e chás,
tenho de tudo pra agradar você !
I I I
Defumador, mais incenso e pinho,
Novalgina, Vick e Melhoral,
cortes de casemira e linho
e Sonrisal, que é sensacional !
I V
Para as meninas tenho AntiSardina,
expectorante pra constipação...
tenho purgante que tudo elimina
e Biotônico é a solução !
Chame os amigos, chame as vizinhas,
tenho de tudo nessa carrocinha !
ABIEZÉR SILVA (& "Nato" Azevedo)
E aí, voltava-se ao início da canção... nesse "intervalo", dedilhando o violão, êle descrevia vários tipos curiosos de vendedores, inclusive o de uma negra que comerciava laranja-lima, "causo" esse que narro em "Relembrando Abiezér Silva (1990)", em meu espaço no YOUTUBE (ver... user/natoazevedo).
"NATO" AZEVEDO (escritor, poeta e compositor) 16/fev. 2017