Garçom, apenas um rapaz latino americano...


 
Nada a ver com a canção de Reginaldo Rossi  ou de Belchior.
Tudo a ver com o dia a dia de quem serve as mesas em restaurantes e demais lugares de alimentação na América Latina (especificamente no Brasil).
Tem a ver com estes rapazes (e moças) que se acomodam à situação de servir alimentação aos outros e fazem com esmero e dedicação religiosa, ritualística e humilde. Em muitos se vê a alegria de servir e conectar-se a quem está servindo. Em outros... Nunca crie casos com garçons ou dê motivos de pequenas desforras. Porque nunca se sabe o que acontece no traslado de tua refeição no curto caminho que o alimento faz da cozinha à mesa.
 
Tenho almoçado em restaurantes (solitariamente como gosto) e às vezes saio para jantar em família para comemorar isto ou aquilo. O almoço eu  tenho feito em um lugar específico pelas qualidades que vi no restaurante. Quando comecei ali minha jornada alimentar percebi que muitas garçonetes tinham sido minhas alunas. Garçons, nenhum deles.
Chegava cedo. Pedia suco natural. E até ser posta a comida para ser servida eu escrevia poesias e crônicas. Claro que a esta estampa tão exótica de uma pessoa se fechar em um mundo de escrita, enquanto outros procuram se conectar com olhares, meneios e falação, o ato parece totalmente estranho. Que figuraça é esta que tira papel e caneta  da mochila, se isola e começa a escrever?! Tenho certeza que é esta a imagem e interrogações provocadas na cabeça de muitos.
Sempre um dos garçons neste lugar vinha me servir e por fim bastava eu chegar e ele já dizia:
- Senhor, suco tal com adoçante à parte e sem gelo?!
Era inverno no alto da serra!
Com o verão chegando, a cena começou a se repetir na parte da praça de alimentação do centro comercial e não mais próximo à bancada do alimento exposto.
No final da primavera o vocativo se dava não com o pronome de tratamento. Mas com o meu nome próprio. Deduzi que foram as ex-alunas que disseram a minha graça e que eu era o assunto entre os que ali servem.
No verão o vocativo fora substituído totalmente. Nem pronome, nem nome, mas apelido reducional para íntimos. Eu era o Leo. Para o tal garçom e todos e todas  demais.
 
Dada já a familiaridade quando eu apontava na praça de alimentação e ele começava com o seu “Suco tal...” eu o interrompi e eu  disse:
- Suco à moda, fulano de tal.
Eu já sabia o seu nome e o trato já era como de grandes amigos. Ele achou a expressão “à moda” inusitada! E quando me via na hora do almoço chegando ali ele já gritava no balcão da cozinha para eu ver que ele havia se apossado da expressão:
- Suco à moda para o Leo!
 
Um dia este garçom, dado o grande movimento no verão, esqueceu-se de fazer o pedido à cozinha. Como eu já estava na metade da refeição eu levantei e fui procura-lo para ver o ocorrido. Ele foi todo pedido de desculpas. Foi motivo suficiente para os demais rapazes zuarem-no  pelo seu lapso profissional.
 
No dia seguinte quando cheguei eu já fui logo dizendo como zuação:
- Suco tal à moda e com eficiência!
O rapaz teve um gozo auditivo! Pela reação deve ter sido a primeira vez que ouvira a palavra e começou a repetir para si mesmo: “Eficiência! Eficiência. Eficiência!”.
 
Fato suficiente para daí em diante fazer parte de seu tratamento quando me vê entrar no estabelecimento se expressar:
- Suco tal à moda para o Leo. Com EFICIÊNCIA! Ressalta para si e para a cozinha.
 
E eu com minha mentalidade de professor de outros tempos e outras escolas pondero:
...onde ele fizera seu curso de garçom para ali estar servindo e desconhecer o jargão “à moda”?! Que nível de escolaridade tem o garçom brasileiro para estranhar e admirar o vocábulo “eficiência”?! Que limitação de vocabulário tem a juventude carente que sai da escola pública latina americana?! ...
E em suspenção de pensamento só encontro reticências!
...


Coisas de professor latino americano!



Leonardo Lisbôa,
Barbacena, 14/02/2017.
 
   
 
 

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Leonardo Lisbôa
Enviado por Leonardo Lisbôa em 17/02/2017
Reeditado em 17/02/2017
Código do texto: T5915735
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