pose
Hoje vi um rapaz que mora em minha rua, reparei que ele havia crescido, ou senão isto, deixado de ser o que era antes. Como o vejo todos os dias brincando na mesma praça, não havia tocado de como ele havia mudado. O bigodinho ralo, penugem ainda sem direção, deitada na pele, a voz um tanto rouca querendo engrossar, o corpo já empertigado como querendo estar no alto, uma certa indiferença típica dos adolescentes.
Vi acender um cigarro e olhava pra longe, sabe-se lá pra onde, e a fumaça saia de sua boca como se fosse parte de um projeto maior. Ninguém fuma um cigarro com tanta importância como um adolescente. Uma arrogância se aprumando, não vi nenhum motivo pra tanto, mas ela já estava lá, aquela arrogância de quem pensa que sabe, que pensa que entendeu algo grandioso. Quando sentou cruzou as pernas, e o tronco cedeu um tanto pra frente como se fosse fazer uma foto para algum catálogo de uma marca importante.
O menininho se estava ali, não tinha espaço para aparecer, o menino foi espremido, talvez extinto, num gesto vazio e sem identidade. A sensação era que a vida lhe havia começado a ser drenada. Apareceu a necessidade de frequentar outros círculos pois aquele anterior já não o satisfazia, no entanto dava pra ver claramente que ele não sabia nada do lugar que ele estava agora. Pretensamente apenas uma pose, um simulacro de existência.
Algo daquilo me entristeceu, não havia mais a graça infantil, um certo ardil havia lhe contornado os gestos, uma malandragem oca e sem vitalidade, os olhos, saltados como um projetor, faminto do mundo e das meninas que sentadas na outra calçada, frequentava outros dramas. Depois da pose de rapaz rebelde procurou olhares que a admitisse,
Segui meu caminho em direção ao trabalho e aquele momento ficou no meu ser. E tomou meu espaço interior como uma agonia, uma situação que não era apenas do rapaz, mas também minha, pois aquela pose que era um ensaio para a juventude trombou com minha própria pose que era um ensaio para a maturidade, que ainda não conhecia.