A Bela

Numa noite aí atrás, ela entrou espavorida pela minha sala adentro, pedindo guarida por causa do mau tempo.
Foi direto para as almofadas sobre o baú; levantei-me do sofá onde estava sentada e surpresa a olhei e é óbvio que ela nem me deu bola. Atirou-se no chão, desnorteada, debatendo-se como se estive em convulsão. Me assustei sem saber, no momento, como agir. Fiquei ali olhando-a, esperando que se acalmasse e desejando que não se machucasse.
Lá fora a chuva continuava a cair, impiedosa para com a urbanidade, raios e trovões riscando o céu de brigadeiro. recordei dos morros e dos muros de contensão que estavam deslizando desde o dia anterior e levando tudo pela frente.
Então ela se acalmou e, de repente, estava confortavelmente aboletada na cadeira da mesa de jantar. Deixei ela ficar. Voltei-me a sentar e esperei, mas lembrei do risco que ela estava correndo em ser caçada pelos cães de guarda da família, a pinscher Amélie Poulain e o poodle Digby Schumacher, especialistas na caça esportiva de “grandes” animais e insetos tipo: abelhas, formigas, aranhas, moscas, entre outros. O que não deixa de ser um passa tempo um tanto quanto perigoso, principalmente porque Amélie Poulain é alérgica e, de vem em quando, temos que bater na porta do veterinário pedindo socorro. Abelhas são bichos altamente perigosos para ela.
Mas a mariposa estava num mar de sorte nesta noite. Conseguiu abrigo e sortuda que era, encontrou um ambiente acolhedor, pois os dois catioros se encontravam recolhidos no santo recesso de suas caminhas a ouvir o barulho da chuva na vidraça. Ainda assim fiquei preocupada. O faro e a audição aguçados poderia muito bem avisá-los de que havia visita em casa e transformar minha sala num campo de guerra. Resolvi tirá-la de lá antes que a situação ficasse insustentável. Alarmada, a bela voou para a beirada do aparador antes que eu conseguisse pôr as mãos nela.
Era muito bonita, grande, toda em tons de marrons com branco, preto e verde. Digo “era”, porque a essa altura sei lá se ainda existe! Algumas espécies vivem por apenas 24 horas após sair do casulo. Não sei se era o caso desta. Mas a natureza havia sido muito generosa com ela, sua beleza parecia à perfeição de uma pintura do suíço Agasse.
Depois de ter levado um papo cabeça com a bichinha ela sossegou e cordialmente, em paga pela hospedagem, deixou-me fotografá-la. Então chamei o marido para ajudar, a tiramos dali com toda delicadeza e a colocamos num vaso de plantas na sacada onde, certamente, ela estaria bem mais segura e poderia ir embora quando preferisse.
Pela manhã o tempo havia mudado, o sol saiu sorrindo e nossa hospede não se encontrava mais lá.
 
 
Roseli Schutel
Enviado por Roseli Schutel em 08/02/2017
Reeditado em 08/02/2017
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