O SABOR DAS LÁGRIMAS

Muito já se escreveu sobre elas. Essas gotinhas paramentadas com a dor ou com a alegria que brotam dos olhos por vontade própria e sempre rolaram impunes pelos rostos humanos, encharcando sem pudor os versos dos poetas.

Segundo Pessoa, salgaram as águas do mar, derramadas pelo choro compungido de noivas e mães de navegadores.

São doces quando, derramadas nos pódios, embriagam os vencedores e significam superação e conquistas.

São tristes, quando tem o sabor travoso das derrotas. Ainda assim, lavam a alma e fortalecem a vontade para a luta.

Já foram amargas no rosto de Petra Von Kant, no talento inigualável de Fernanda Montenegro. Parecem falsas no teatro, no entanto, geram emoções verdadeiras.

Podem ser mensageiras da tristeza ou da alegria, da dor, da ira, das perdas irremediáveis ou de arrebatadores contentamentos. Indóceis como crianças voluntariosas, escapam pelas frestas dos olhos, sem se deixar aprisionar por emoções. Como é difícil engolir um choro!

O que é uma lágrima? Essa enigmática gota d'água, meio salgada, que, não raro, encabula os homens e se alia aos mais secretos propósitos das mulheres? Capaz de amolecer corações empedernidos, mover vontades, despertar sentimentos, encerrar discussões e abrir as carteiras dos avarentos? Quem ousaria afirmar que nunca se derreteu diante dos olhos molhados de uma criança ou de um rosto de mulher em prantos?

Milan Kundera fala da misericórdia da lágrima numa cena comovente em que o choro dos amantes funciona como um mecanismo de mútuo perdão das traições amorosas, numa volúpia de dor e prazer.

São tão fortes e presentes na vida humana que nem mesmo o Cristo pôde fugir ao seu poder. As lágrimas de Madalena lavaram-lhe os pés e obtiveram seu perdão. Para secar as lágrimas de Maria, Cristo realizou o milagre da ressurreição, trazendo seu irmão Lázaro de volta à vida.

Existe algum ato mais humano e mais comovente do que chorar?