No ônibus

Passava das sete da noite e o ônibus da viação Montes Belos percorria as ruas da cidade de Goiânia, saíra de Campinas e ainda passaria na rodoviária principal antes do destino final. E lá estava minha esposa e meus filhos aconchegados nas poltronas da frente, menos eu. Eu ficava tentando me acomodar em uma poltrona apertada.

– É impressionante como é apertado aqui. – eu resmungava.

Mesmo sabendo disso, eu sempre viajo neste ônibus. Acho que é apenas mais uma das tantas contradições da vida – reclamamos, reclamamos e não mudamos –, é como quando chove queremos o sol e quando o sol vem, desejamos a chuva. Nunca estamos satisfeitos com nada.

Depois de alguns minutos, o veículo para na rodoviária. “Ahh! Teremos de esperar um tempão aqui até lotar.” Voltei a resmungar. De repente, entra uma família, o pai, a mãe e uma garotinha de aproximadamente dois anos – uma gracinha de criança. Até aí tudo bem, mas bastou o ônibus sair para o showzinho dela começar. Ela gritava, pulava na poltrona, dava tapas e escorregava entre os braços do pai, e a mãe: Ahhh!!! A mãe só repetia esta frase: “Filha, isso não pode!” Ai, como fiquei agoniado ouvindo e vendo a passividade daquela mulher diante da hiperatividade da filha.

Enquanto a Mariazinha estava só no âmbito dos pais, teve como aguentar, a situação tomou proporções maiores quando ela resolveu passear pelo corredor do ônibus, balançando seu corpo frágil pra lá e pra cá e, a cada freada do veículo ela era jogada contra as pernas das pessoas sentadas em suas poltronas. Vez ou outra um senhor a segurava e repreendia os pais que, inertes em uma passividade terrível, pareciam achar aquilo uma maravilha. E com isso, eu me irritava a ponto de querer dar uns berros exigindo alguma providência por parte daquelas pessoas que se diziam pais dla menininha, no entanto, fiquei quieto em meu canto, quer dizer, em minha poltrona apertada.

Bastou meu filho abrir seu pacote de Skinny, para a garotinha dar um tempo em seu showzinho particular. Acho que a mãe dela respirou aliviada nessa hora. A pequena Maria parou ao lado de meu Luís Ricardo e pediu o lanche dele e como criança não faz acepção, tampouco se recusa a dividir sua comida, na maior boa vontade, ele enchia a mão da outra com seu Skinny até a mãe resolver abrir o pacote de salgadinho e dizer:

- Filha, venha comer o seu!

- Não... Não... – ela respondia.

- Filhaaaa, venha!!! – a mulher insistia, com uma voz irritante.

Como as atitudes daquela mulher me irritavam. O pai, por sua vez, ficou em pé e resolveu agir, pegando-a com uma mão enquanto a outra segurava firme no corrimão acima de sua cabeça. Depois de alguns minutos, a criança acalmou-se e até aceitou deitar-se no colo da mãe e dormir.

Eu fiquei todo feliz e aliviado: “Finalmente ela se calou! Agora vou poder tirar uma soneca!” – Pensei. Infeliz engano, pois quem resolveu dar o ar da graça foi meu pequeno Luís Ricardo. “Ahh, não! Faz isso não, cara!” – eu disse com um tom melancólico. – Justo agora que ela se calou, você começa a chorar, meu filho. Ele deu birra, gritava, chorava, sua mãe, já inquieta – ao contrário da outra –, tentou de várias maneiras fazê-lo calar, mas nada adiantava.

Depois de muita azucrinação, um homem sentado na poltrona à frente, vira-se e tenta acalmá-lo e vendo que não adiantaria, resolveu contar sobre um tal João Truculão, pegador de crianças choronas. “Por que você não entrou em cena antes, meu querido!” – era o que eu pensava. Como a estratégia daquele desconhecido deu certo. Meu pequeno rapaz, de apenas dois anos, ficou caladinho, ouvindo atenciosamente a sequência da história narrada pelo homem. Era como se estivesse, de fato entendendo-a. Acho até que estava. Após isso, não tivemos mais problemas, as coisas se acalmaram e pude cochilar um pouco na minha viagem de volta a Cariri do Tocantins.

(Dorcídio Ponciano)