DO PÓ AO PÓ

e souza

O maior receptor de imigrantes foi os Estados Unidos, mas criaram barreiras para a entrada de estrangeiros, isso tudo a partir da década de 1870, inicio da maciça imigração de italianos para o Brasil.

Todos sabemos que esses ilustres imigrantes vinham e traziam daquela terra maravilhosa (eu não estou falando do Rio), belas receitas, temperos, condimentos, etc.

Por volta da década de 1970, uma família que ainda morava na Itália sempre escreveu para a outra parte da família que migrou para o Brasil, junto a essas cartas, vinha da Itália uma caixinha de sapatos e dentro dela continha saquinhos com temperos, condimentos, ervas moídas, umas com forte odor, outras com odor e sabores marcantes.

Na carta vinha escrito exatamente o nome de cada erva e em que prato determinada erva seria melhor aplicada. Quando a carta e a caixa de condimentos chegavam era a maior festa, isso acontecia a cada seis meses, a família toda se reunia para um almoço especial e normalmente era no sábado.

As pessoas se reuniam à mesa para comer, beber, brincar, contar “causos”, se deliciar com ótimos vinhos e dividir as especiarias que vinham dentro da caixa em saquinhos na cor branca.

Normalmente ia para a ponta da mesa uma pessoa que lia a carta em voz alta e bom tom e a cada linha, a cada parágrafo, a cada virgula e pausa, os sonhos, as lembranças vinham à tona e a cada olhar, e cada gesto uma saudade. O ritual era uma festa, os saquinhos eram distribuídos a cada pessoa à volta da mesa e cantarolavam felizes, brindavam a cada notícia dada. Dessa vez não foi diferente e podiam “matar” a saudade da “Nona”. Era ela quem preparava os saquinhos com os temperos, tudo muito bom, a não ser pelo fato de os Correios não terem entregue a carta juntamente com a caixa, de resto, tudo saiu perfeito, os condimentos foram usados nos almoços e jantares de cada família, mas não escondiam a vontade de ouvir a leitura da carta que certamente em breve chegaria. Algumas semanas depois a tão esperada carta chegou e a maioria dos temperos já haviam acabado, inclusive o que estava no saquinho verde, pois parecia muito especial, pois era muito saboroso e todos acabaram com eles e estavam até prontos para pedir mais. A família foi novamente convocada para mais uma reunião festiva para a leitura da carta. E lá estavam todos sentados à mesa com vinhos e outras bebidas e comidas e o momento mais esperado chegou, e a carta que chegou atrasada podia agora ser aberta na frente de todos e lida para a alegria geral.

Foi mais ou menos assim:

“Meus queridos familiares,

Sabemos que todos esses anos se deliciaram com os temperos preparados com todo carinho pela “nona” . Estamos todos com muita saudade, (...).

Infelizmente a “nona” faleceu, mas não sofreu, somente dormiu tranquilamente, a dor é grande e a saudade maior ainda. Estamos tristes sim, mas também consolados por ela ter descansado . Ela já havia a algum tempo preparado alguns saquinhos com temperos e estava feliz por isso, (...). O corpo da nossa querida “nona” foi cremado, como era seu desejo, e tomamos a iniciativa de enviar para cada um de vocês um pouco das cinzas em saquinhos verdes para que toda a família tenha um pouquinho do corpo dela sempre junto e que tenham gostado dos temperos e que guardem os saquinhos das cinzas em lugar iluminado, (...). Grande beijo em cada coração.”

Bem, eu não sei como terminou esse fim de semana cheio de surpresas. Foi assim que uma amiga do primo da cunhada do irmão da tia do sobrinho da enteada do sogro de uma conhecida me contou.

Já ia me esquecendo; ela também participou do almoço.

É isso aí.

Email: edsontomazdesouza@gmail.com

E Souza
Enviado por E Souza em 03/02/2017
Reeditado em 16/03/2017
Código do texto: T5901500
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