E ASSIM CANTAVA O SABIÁ

Hoje lembrei-me de meu avô Adelino. Fomos à velha chácara da família, onde alguns homens retiravam o mato verde que insistia em crescer sufocando os bananais e os coqueiros. Enquanto papai fiscalizava o trabalho suado daqueles mulatos eu recordava o “vô” preto. O “Seu” Adelino, como era conhecido na região, acordava cedinho, como as galinhas do tio João e ia capinar. “Vô” Adelino capinava e cantava. Batia a enxada contra o chão terroso e arrancava pela raiz a erva daninha. O suor descia-lhe pela testa preta, mas isso não o incomodava e não parava de cantarolar. O “Vô” cantava para os sabiás e se via algum de asa quebrada corria para ajudar. Afagava a cabeça aveludada do bichinho que não parava de piar. O “vô” Adelino fora sertanejo não sorria nunca e vivia como bicho no mato, o seu único encanto era capinar. Ai que saudade de quando acordava embalada pelo canto dos bem-te-vis e dos sabiás e assistia o “vô” Adelino, preto triste, capinar e cantar. Naquele tempo a vida era simples, não tinha o que preocupar.

Rachel Wolf
Enviado por Rachel Wolf em 31/01/2017
Código do texto: T5897917
Classificação de conteúdo: seguro