Visões ...
Naquela noite eu iria dormir em casa de minha tia Júlia.
- Seu pai está no botequim! Disse-me ao chegar, meu primo Jorge. Preocupada perguntei:
- Ele está embriagado?
- Bastante! Respondeu Jorge, estava inclusive numa discussão ferrenha com o Sr. Mauricio. Discutiam por causa de um problema com o cavalo que vai correr no pário do próximo final de semana.
O botequim era um pequeno bar do vilarejo, o único para ser sincera, e o único lugar onde vendiam bebidas alcoólicas, e quando meu pai estava lá sabíamos bem o que iria acontecer.
Papai havia comprado um novo cavalo, para participar das
corridas, que aconteciam em uma cancha reta nos finais de semana. Ele mesmo mandou construir esta cancha em nosso pequeno lote de terras, onde antes estava o campo de arroz. Este era o único divertimento para os habitantes de nossa pequena vila.
O cavalo era um animal muito bonito, tinha o pelo brilhante,
era um animal de porte, papai se preocupava mais com a saúde do Zaino do que de qualquer um de nós e dizia.
- Ele não sabe falar o que sente, precisamos ter muitos cuidados...
Na véspera das principais corridas o Sr. Maurício que era o
tratador do cavalo, tinha que colocar sua cama junto à cocheira, pois papai tinha medo que algum adversário, para prejudicá-lo desse algum tipo de droga ao animal.
- Venham para a mesa o jantar está servido! Disse minha
tia Júlia.
Fomos todos para a sala de jantar onde um lampião de gás iluminava o ambiente. A mesa estava servida e cada um ocupou o seu lugar. De repente tive vontade de fechar os olhos, e então vi minha
mãe com o rosto coberto de sangue as imagens se fundiam na minha cabeça. Fiquei desesperada e levantei em um salto, assustando minha tia e primos que sem entender perguntaram:
- O que aconteceu? Você está branca como cera! Oque houve?
- Preciso ir para casa! Preciso ver minha mãe! E chorando saí pela porta sem que ninguém entendesse o motivo.
Estava escuro lá fora e em uma situação diferente eu teria medo de colocar o pé para fora da porta. Mas continuava com aquela imagem que em certos momentos me confundia, e eu não conseguia saber se aquele rosto era de meu pai ou de minha mãe. Não notei e nem senti medo da escuridão, simplesmente corria em direção a minha casa.
Não sei quanto tempo corri, mas só parei ao entrar na casa. Mamãe e meus irmãos estavam á mesa de jantar, alegres e todos bem. Minha mãe estranhando e sem saber o que estava acontecendo perguntou:
- O que aconteceu? Você brigou com seus primos? Aposto
que foi com o Jorge!
Jorge e eu tínhamos quase a mesma idade e vivíamos brigando
como gato e cachorro como dizia minha tia.
- Não briguei com ninguém! Onde está papai?
- Saiu para encontrar o Sr. Maurício no botequim. Disse minha mãe. Queria saber sobre o medicamento do cavalo que não estava no lugar de sempre. Não entendo porque ainda não voltou!
Minha mãe acabou de falar e naquele momento ouvimos alguém chamando por ela em frente á casa.
- Maura! Maura! Reconhecemos a voz de nosso vizinho Sr. Vicente. Corremos todos para fora. Estava muito escuro, mas pude
ver que meu pai estava debruçado sobre o cavalo. Mamãe correu em sua direção e eu fui junto com ela. Papai tinha um grande corte na parte frontal da cabeça. Naquele momento consegui visualizar seu rosto coberto de sangue.
Era a mesma imagem que vira durante o jantar na casa de
minha tia, só que agora era real.
Esta crônica faz parte do livro IMAGINAÇÕES QUE SALVAM de Lay Faggundes