Toque uma canção antiga

Música antiga é atualmente um dos meus melhores passatempos.

Fico horas buscando no youtube aquelas canções do passado que de alguma forma me marcaram.

Tenho um gosto um tanto eclético, vou do rock ao brega, passeio em vôos rasos pela MPB, gosto também de samba e sertanejo, desde que sejam os de raiz.

É exatamente na raiz do samba que gosto de me perder.

Causa-me espanto quando alguém confessa que não conhece o Cartola, o compositor que afirmou que “as rosas não falam”, contrariando meu pensamento de outrora, que acreditava que as rosas sussurravam poemas.

E como sempre confundo rosa com flor, Nelson Cavaquinho me ensinou que espinho não machuca a flor.

Mas será que o espinho às vezes não se confunde com o perfume que a rosa exala?

Mais um clique na tela do computador e me torno apenas um rapaz latino americano, sem dinheiro no banco.

Por onde andará o Belchior?

Ele bem que avisou antes que iria sumir: “Se você vier me perguntar por onde andei...”.

De repente tudo muda quando ouço Creone, Barrerito e Mangabinha.

Quem?

O Trio Parada Dura, que navega num barco de papel em busca do castelo de amor e que acaba bebendo o orvalho das flores.

E já que falei tanto sobre rosas, espinhos e flores, devo acrescentar a canção divina que agora me invade os ouvidos causando enlevo: a pétala do Djavan.

Mas será que o amor é mesmo exato?

Rosa, flor, espinho, pétala...

Do que mais você precisa para compor um belo poema, amigo poeta?

Troco de novo o ritmo, curto Legião, Titãs, RPM.

Que coisa estranha esse Paulo Ricardo que nunca envelhece!

Fagner musicou os poemas da Florbela Espanca e da Cecília Meireles, e tudo ficou tão lindo...

Toca Raul! A minha turma costumava gritar para o carinha que dedilhava a viola, sentado num banquinho de bar.

E eu não sei se era efeito do álcool ou se por culpa da fumaça do cigarro, mas o cantor sempre se tornava a imagem perfeita do Raul Seixas.

Ainda que tivesse a cara lisa, o enxergávamos de cabelos longos e cavanhaque.

Nas iris de nossos olhos, entre um gole e outro de cerveja, depois de andar pelos quatro cantos do mundo, procurando, compreendíamos que somos feitos da terra, do fogo, da água e do ar.

E tudo voltava até dez mil anos atrás.

No final, o carinha do violão provocava: “tente outra vez”.

E a gente prosseguia tentando.

Uma noite de Nagibão – o melhor barzinho que já existiu em Campo Grande- era tudo o que precisávamos para que a vida prosseguisse pelos caminhos ternos da juventude.

Ah, que dor eu sinto quando hoje passo em frente e percebo que o Nagibão agora é apenas um estacionamento.

E troco de novo a música no Youtube, sim querida Mercedes, “el tiempo pasa, nos vamos poniendo viejos”.

Hoje eu entendo perfeitamente o trecho daquela canção do Geraldo Espíndola: “saudade existe pra quem sabe ter”.

Saibamos então sentir saudades, que no meu caso, basta um clique no youtube que o tempo volta, dói um bocado, mas é uma dor tão gostosa que acaba ajudando a viver.

E o que é a vida? É a rosa, os espinhos, são as pétalas que voam através do tempo em forma de lindas canções.