IMAGINARIUM
Prof. Antônio de Oliveira
antonioliveira2011@live.com
Virgílio louva o homem do campo para quem são destituídas de valor as questões públicas e os reinos destinados a perecer. No original: “non res Romanaeperituraqueregna”.
Hoje, uma imagem insólita, objeto de nostalgia. Modernizada, a fazenda se descaracterizou. Gado de raça, de cocheira; eletrificação, inseminação artificial, manejo de pastagens, ordenha mecânica, camionetas, tratores, registros computadorizados. Tudo, enfim, que traz conforto, racionaliza o trabalho, aumenta a produção,mas desafia, enfrenta, desfigura o sertão.
Para João Guimarães Rosa, “Sertão é dentro da gente”, símbolo de troca de senha, apenas. Sertão dentro de mim, sem fim, até o fim, até os confins.O sertão é do tamanho do meu mundo. Sim, amparado por Carlos Drummond de Andrade, posso sempre ter, como Um chamado João: pastos, buritis plantados em apartamento, no peito.
Na década dos 40 esse panorama de interior mineiro era diferente. Fazenda antiga, casarão; terra batida, nua, dura e seca pela força dos cascos dos animais, grandes currais divididos pelos pastos.Pastagens extensas, gado solto: nelore, guzerá, caracu, mestiço. À sombra de árvores esparsas, reses ruminando; touros selvagens, em liberdade, alheios à própria imponência, descansados. Dos janelões da casa grande, fincada num pé de serra, uma paisagem descontraída: “Enquanto pasta alegre o manso gado /Minha bela Marília...” Continua o inconfidente Tomás Antônio Gonzaga: ““Atende, como aquela vaca preta / O novilhinho seu dos mais separa /E o lambe, enquanto chupa a lisa teta”.
Cai o pano. Rangido,batido da porteira. Taramela. Cerra-se a memória. O moinho não é mais moinho. O sussurro da água se foi. Ou a vida é um moinho, dentro da gente? Mói, mói, mói, até parar. Tritura. Só não mói minha fé. Trocando o sertão por moinho, levo um moinho dentro de mim. Esta vida não será mesmo um moinho? Dom Quixote a combater moinhos de vento como se fossem gigantes de braços enormes.