CALIGRAFIA DE UMA EMOÇÃO.

Hoje, acordei nostálgica. E o pensamento ainda divagava por tempos passados, quando ainda utilizávamos de cartas manuscritas para trocarmos mensagens. E os motivos para uma correspondência eram muitos. Muitas vezes, inclusive, escrevíamos para comunicar fatos carregados de tristezas, como por exemplo, a doença ou falecimento de algum ente querido. Ou, escrevíamos para expressar um grande amor que já não cabia no peito. Um amor cujo destino decidiu sabe-se lá, por que, afastar, esquecendo-se de que a distância não separa corações apaixonados, quando verdadeiramente, o cupido os tenha flechado com tamanha intensidade.

Dizem os grafólogos que a caligrafia diz muito sobre a personalidade de cada um. É quase como uma impressão digital. E é verdade. Ainda hoje, a assinatura vale como documento. Mas não é só isso. Um estudo mais profundo da nossa escrita pode revelar muitos traços do nosso temperamento. Segundo os grafólogos, uma letra menor ou maior, redonda ou pontuda, têm significados diferentes. Até mesmo, o modo como aproveitamos o espaço da folha, pode revelar segredos sobre nós mesmos.

Ponho-me então, a imaginar quanta magia, energia e encanto transportava uma carta de amor. Fico pensando quanto romantismo, emoção e sentimentos deveria haver nas cartas carregadas de paixão. O ato de escrever uma linda carta de amor já começava com a escolha do envelope. Havia vários...coloridos, enfeitados, decorados, menores, maiores, para todos os gostos. E os papéis de carta acompanhavam o modelo dos envelopes. Eram tão lindos...Quem arriscaria dizer o que poderia haver por trás de uma letra tremida? Saudade? Emoção? E aquele borrão entre uma linha e outra? Teria sido uma lágrima que, distraidamente, tenha caído sem que o remetente tivesse percebido? E o perfume? Sim, algumas dessas cartas chegavam perfumadas...e assim permaneciam por muito tempo. Muitas dessas cartas revelavam sentimentos escondidos ou reprimidos. Sentimentos cujas cordas vocais não conseguiam articular em palavras. Palavras engasgadas, carregadas de profunda emoção, que somente os poetas conseguem traduzir.

Para alguns, cartas de amor são ridículas. Para mim, “ridículo” é nunca ter amado. Ridículo para mim, é nunca ter recebido uma carta de amor, é morrer sufocado pelas palavras abafadas no peito...

O carteiro era esperado como ninguém mais. E quando trazia nas mãos, nossa tão desejada correspondência, a vontade que tínhamos era de abraçá-lo e agradecer pelo momento de grande felicidade.

Pois é, os tempos mudaram. Sempre mudam. Mas o amor há de sobreviver. E, não me refiro aqui, somente ao amor romântico. Refiro-me a todos os tipos de amor. Se algum dia, não mais houver amor, teremos ainda razão de viver? Terá motivos para bater, um coração vazio de bons sentimentos?

Hoje, temos a rapidez da comunicação instantânea. Temos símbolos e carinhas bonitinhas e idênticas, traduzindo emoções nem sempre, verdadeiras. Decerto que o avanço tecnológico nos facilitou a vida em muitos aspectos, mas ao mesmo tempo, nos privou de tantos outros prazeres...Privou-nos da expectativa gostosa da chegada do carteiro, privou-nos do prazer olfativo ao receber cartas que perfumavam a alma e que eram seladas com eternos e apaixonados beijos de amor. Que pena...que pena.

Elenice Bastos.

“Cartas de amor são escritas, não para dar notícias, não para contar nada, mas para que mãos separadas se toquem ao tocarem a mesma folha de papel”.

( Rubem Alves).